O último episódio de Ligações Perigosas não pode ser encaixado nem como um final feliz e nem como uma desgraça completa. Cada personagem recebeu aquilo que buscou, como costuma acontecer na vida.

A morte de Augusto repercutiu de formas diferentes entre seus entes queridos (e não tão queridos também). Mariana, como já tínhamos visto, se rendeu à morte junto com o amado, Isabel tentou distrair o luto organizando festas regadas a sexo e entorpecentes, dona Consuelo revisitou fotografias antigas do sobrinho e Felipe buscou vingança e redenção entregando as cartas que Augusto confiou a ele.

Isabel perdeu tudo o que lhe era caro. Perdeu seu parceiro, a credibilidade, a influência, os bens materiais e, por fim, a beleza. A cena em que é desmascarada no teatro lembra muito a do episódio “Disgrace” de Revenge, em que Emily Thorne é exposta durante a ópera e foge correndo em um belo vestido de gala tentando se agarrar à dignidade enquanto os flashes a cegam. Uma boa intriga é um prato cheio para que todos os dedos apontem para a madame e condenem seus pecados do passado e do presente. No fim das contas, Isabel não tinha amigos, apenas pessoas que a orbitavam para se beneficiar da sua riqueza e status social. Uma velha carta com uma confissão subjetiva pode não ter sido prova suficiente para manda-la para a cadeia pela morte do marido, mas foi o bastante para bani-la definitivamente da alta sociedade.

Felipe perguntou a Consuelo se um homem traído não tinha o direito de se vingar. Bem, a resposta é não… ao menos não tirando a vida de alguém. Ele pode ter sido uma das maiores vítimas de Augusto e Isabel, mas virou um assassino e teve que abrir mão de tudo – do amor a Cecília, da música, da própria identidade – para manter a liberdade. Foi viver fugindo, atormentado pelas consequências da trama de mentiras e traições em que foi jogado. Isso é, considerando que ele sobreviveu a uma fuga naquele barquinho ridículo.

Dona Consuelo, tão doce e amigável, mostrou que também sabe conspirar quando é preciso, e manipulou Heitor e Iolanda para que o casamento de Cecília acontecesse antes que a barriga da moça começasse a crescer. Também deu a dica que ela precisava para enganar o marido na noite de núpcias (e aí eu fico pensando, como será que faziam as mulheres que nasciam sem hímen ou que o perdiam durante atividades cotidianas e não sexuais quando se casavam naquela época?). Cecília conseguiu disfarçar o filho bastardo que carregava, mas sempre vai ver a criança como um lembrete da sua desgraça, e a forma como ela delega a criação do menino à criada, sem nenhum interesse, é uma prova disso. Percebe-se que não é uma mulher feliz e que perdeu aquela sede de beber o mundo inteiro que tinha quando deixou o internato, mas também não escondeu a satisfação de saber que sua maior inimiga estava em uma situação bem pior que a dela.

O primeiro episódio de Ligações Perigosas empolgou bem mais que o último. O encerramento foi morno, apesar de ter fechado todos os pontos em aberto, e previsível, sem qualquer reviravolta que não tivesse sido anunciada no episódio anterior. Isabel perder tudo e deixar Cecília e Heitor serem felizes não combina muito com a personalidade da madame. Fugir com diamantes talvez sim, mas não em condições tão precárias.

Analisando de forma geral, o saldo da minissérie foi positivo, mas com diversas ressalvas. Enquanto tivemos um bom início e alguns capítulos impecáveis (o terceiro e o sexto foram inesquecíveis), o meio se perdeu e derrapou no tempo e na forma como alguns acontecimentos foram conduzidos. Entre o que funcionou, destaco as personagens de Isabel e Mariana, que foram consistentes e muito bem defendidas pelas suas intérpretes. Cecília foi melhorando com o tempo, mas também acertou o tom no fim das contas. Embora tenham tido participações menos expressivas, Vicente, Otávio e Collete foram adições muito positivas à trama. Augusto, para mim, deixou a desejar. Selton Mello é um ator competente, mas o texto e a direção não conseguiram dar a Valmont os contornos que ele exigia, como a sedução e uma pitada de psicopatia. Também não consegui me conectar ou torcer pelo personagem em nenhum momento – e isso nem se deve à sua postura moralmente questionável, já que com Isabel aconteceu o oposto.

Além dos personagens, os grandes acertos de Ligações Perigosas foram a fotografia, a trilha sonora e toda a ambientação do Brasil dos anos 20. Foi delicioso ver o cuidado da produção com os figurinos, objetos cenográficos, veículos e costumes da época. Fica a torcida para que a Globo continue trazendo produções com esse apuro estético, mas que aprenda com os deslizes na construção da trama – que, no fim das contas, é a alma de qualquer produto de dramaturgia.

Obrigada a todos que acompanharam quietinhos e principalmente aos que comentaram as reviews ao longo dessas duas semanas, aqui no blog ou por algum canal pessoal comigo. Foi a primeira vez que cobri um programa diário e, apesar de intensa, foi uma experiência super bacana, espero que para vocês também. Se você gostou, se odiou ou se tem qualquer observação, é a sua última chance de deixar um comentário, então capriche!