Aquele em que dizemos adeus

Pra quem não sabe, o Apaixonados por Séries existe há quase dez anos. Eu e Camila…

O que esperar de 2018

Antes de mais nada, um feliz ano novo para você. Que 2018 tenha um roteiro muito…

Ligações Perigosas – Episódio 5

Por: em 9 de janeiro de 2016

Ligações Perigosas – Episódio 5

Por: em

Ligações Perigosas encerra a sua primeira metade com um pequeno problema de ritmo que acabou gerando um grande problema no desenvolvimento dos personagens. Os primeiros três episódios pareciam construir uma base sólida para a trama correr naturalmente, mas os dois episódios mais recentes tropeçaram entre os solavancos dos fatos e transformaram aquela fundação concreta em um tremendo lamaçal em que a segunda metade da série tem grandes chances de atolar.

isabel collette

De todos os personagens, a única que se manteve imune aos lapsos de construção foi Isabel. Nem sempre as coisas saem da forma que ela espera, mas madame sempre encontra uma forma de reverter a situação a seu favor. Se o advogado não cedeu à sedução para perdoar a dívida que ela herdou, a solução foi trazer Collette d’Or,  filho crossdresser que ele renegava, para agitar a vida noturna da cidade. Depois de fazê-lo perder o controle em público e garantir que um repórter espalhasse a notícia, foi fácil envolver o Sr. Hemorroidas em outra das suas armações e manda-lo para a cadeia. Para quem passou meses sendo violentada pelo marido, aguentar algumas pancadas para manter o padrão de vida – e de quebra enterrar um desafeto – não é nada.

Mais uma vez vale reparar sobre como Isabel é uma mulher à frente de seu tempo, e como as suas ideias são precisas e esclarecidas, ainda que sirvam para propósitos questionáveis. Ela manipula as pessoas porque acredita que está acima delas, que todos podem ser peças dos jogos que ela monta na própria cabeça, e lidar com gente tão tacanha e conservadora reforça essa ideia. A conversa com o advogado sobre aceitar ou não Collette pode ser considerada avançada até para os dias de hoje, imagine há quase 100 anos. Ela fez questão de defender o novo nome da artista e o direito que ela tem de escolher como quer viver. Sim, foi um discurso para provocar, e não por ela ser “politicamente correta”, mas isso não tira o mérito de ser uma posição vanguardista para os anos 20.

E aí partimos para Cecília e Augusto, o plot mais decepcionante desta primeira metade da minissérie. Antes de qualquer coisa, ressalto que o estupro em si era esperado se a série seguisse mesmo a obra original e até a linha da maioria das adaptações. Dito isso, reitero que a execução do ato, e agora as suas repercussões, foram absolutamente mal conduzidas e um desperdício de tudo o que criaram antes da tal cena. Eles tinham todos os elementos para fazer de Cecília e Augusto uma dupla realista, mas a preguiça e o timing equivocado arruinaram isso, irremediavelmente.

augusto-cecila

Desde o internato, Cecília foi mostrada como uma menina bastante curiosa sobre as “coisas da vida”. Beijava o espelho, recebia carícias de Sofia e ficou muito empolgada quando viu o mundo lá fora. Mudou de ideia sobre as aulas de música assim que colocou os olhos no professor magya, e já estava aprendendo a contar pequenas mentiras para a mãe para conseguir o que queria. Por outro lado, é extremamente ingênua e influenciável. Os dois fatores juntos seriam a mistura perfeita para que ela hesitasse, mas acabasse cedendo a Augusto – o que não aconteceu, ele simplesmente a forçou. E como, depois de ser forçada, ela aparece falando com Isabel com tanta naturalidade e tantos sorrisos sobre o que aconteceu, se mais cedo estava se acabando de chorar? Como ela sai da mesa de café da manhã nervosa por derrubar um suco, e não enojada com as provocações de Augusto? Como ela não passa uma noite sequer com as portas trancadas, e já no dia seguinte está rindo na cama com o novo amante? O roteiro se baseou sim em cenas do livro, mas a execução foi falha e o tempo foi mal calculado, tudo ali é precipitado demais, e, por isso mesmo, pouco crível.

Não menos precipitada foi a trama de Mariana, que pouco apareceu no episódio passado e de repente resolveu fazer tudo ao mesmo tempo. O cuidado e as atenções de Augusto fizeram com que ela se apaixonasse, mas foi o distanciamento e a frieza que fizeram com que ela se rendesse. Ela esperava aquele momento na mesma medida em que o temia, e mesmo assim pareceu abrupto demais o gesto de se jogar na cama e esperar que ele a tomasse daquele jeito. Mais uma vez, faltou contexto. Em vez disso, ele simplesmente a deixou, na tentativa de provocar ainda mais a coitada, fazê-la implorar.

Isabel insiste que Augusto está apaixonado por Mariana, enquanto ele insiste que não. Nos moldes tradicionais, é difícil chamar de amor o que ele faz com ela, já que sempre a encarou como um alvo, uma meta a ser alcançada, um desafio. Por outro lado, Augusto tem uma visão tão distorcida sobre a vida, sobre as pessoas e as relações que talvez essa seja a sua forma de amar, mas por acreditar que isso é uma fraqueza, tenta ferir em vez de acolher a dona dos seus sentimentos. Apesar de estarem em uma posição de presa e predador, ambos estão, à sua maneira, fugindo e correndo atrás dos próprios sentimentos.

augusto-mariana

Depois de ser “recusada”, ela praticamente foge da Quinta e se nega a receber as cartas de Augusto, mas no dia seguinte já está trocando confidências com dona Consuelo e declarando seu amor pelo libertino. A cena em que ela se tortura mostra como Mariana está desaparecendo no meio da paixão, da culpa e da vergonha que ela sente. Ela acredita que por não ter mais “virtude”, precisa, no mínimo, continuar sendo uma mulher honesta para ter algum valor, e os sentimentos que nutre por Augusto destroem tudo isso. Ela foi completamente tomada pelo conflito que vive, e a automutilação é apenas a ponta aparente do lado de fora de alguém que está completamente flagelada por dentro.

Algumas observações:

– A história que Augusto contou a Cecília sobre Iolanda se parece muito mais com algo armado por ele mesmo que por um marido desconfiado.

– O padre concordou fácil demais em entregar a carta de Augusto, ainda mais sabendo da fama do moço.

– Se Felipe já estranhou a cartinha apimentada de Cecília, imagine quando ele reencontrar a moça, beeeeem diferente que da última vez.

– Como um ser que anda com uma almofadinha inflável de hemorroida no bolso e tem aquele tanto de seborreia traz ao mundo uma criatura tão divante quando Collette d’Or?

– Heitor anda sumido demais. Um noivo devia visitar a noiva de vez em quando, não? Será que só vão se encontrar no casamento?

Apesar de ter personagens complexos e uma trama interessante, Ligações Perigosas parece ter entrado em uma zona de turbulência na forma como conta essa história. Será que eles vão conseguir levar a trama de volta ao caminho certo? O que achou da primeira metade da minissérie? Deixe seu comentário e até semana que vem!


Laís Rangel

Jornalistatriz, viajante, feminista e apaixonada por séries, pole dance e musicais.

Rio de Janeiro / RJ

Série Favorita: Homeland

Não assiste de jeito nenhum: Two and a Half Men

×