“Querido diário, esse é o segredo, eu acho. Você não precisa de ideias fixas sobre quem é ou para onde vai. Você não precisa de ofertas, notas ou carimbos de aprovação. Você só precisa estar preparado para qualquer porcaria que apareça em seu caminho. E quanto às coisas loucas, os problemas mentais e a maluquice, bom, é tudo meu, querido diário. Tenho que aguentar isso. Isso viaja comigo”.
Dizer adeus nunca é fácil. Seja para um programa de TV ou uma fase inteira de nossas vidas, a despedida sempre vem carregada de tristeza, melancolia e questionamentos. É em meio ao turbilhão que apenas um ponto final pode trazer que reencontramos Rachel Earl pela última vez. Em uma ótima metáfora para o desfecho da própria série, vemos Rae, sua família e a gangue em um momento de transição, no qual precisam encerrar uma etapa e seguir em frente.
Estamos em junho de 1998, dois anos após o início de nossa história, e tudo parece bem. Rae está feliz, está saudável, tem uma família amorosa – com direito a uma irmãzinha fofa– , amigos incríveis, um trabalho que ama e um namorado maravilhoso. Perfeito, não é mesmo? Bom, ao menos até ela se deparar com fato de que está se formando no colégio, precisa decidir o que fazer com seu futuro e lidar com o pânico ocasionado pela perspectiva de ir para a faculdade e finalizar a terapia.
O medo da garota é completamente compreensível. Primeiro, porque encarar o desconhecido é sempre assustador e inquietante. Segundo, por todo seu histórico de instabilidades e problemas. Ela está bem. Ela está finalmente bem e, de repente, todas sua estabilidade, certezas e a base com que conta para não desmoronar se vêem ameaçadas. É natural, portanto, que entre pânico, se sinta insegura e deseje fugir desse futuro que chegou sem ser convidado.
Essa tentativa de fuga, no entanto, faz a menina acabar presa à uma teia de erros que vão desde de abalar seu relacionamento com Finn à acidentes de carro, passando por voltar a se machucar. É claro que o acidente e o fato de Chloe ter se machucado não é culpa de dela, mas, por tudo o que vimos até aqui, faz sentido que a garota se sinta responsável. Afinal, estamos falando de alguém que sempre sentiu que arruína tudo e todos a sua volta.
Em meio a esse cenário nada animador, entretanto, vemos o fortalecimento da amizade entre Rae e Chloe. Se quando as conhecemos, nos primórdios da primeira temporada, a relação entre as duas era marcada por uma lógica de competição feminina, inseguranças e ressentimentos, vimos que durante esses dois anos – e após passarem por uma série de problemas – as garotas cresceram, amadureceram e aprenderam a se amar, respeitar e perceber o mundo pela perspectiva uma da outra.
Elas são Rae e Chloe, duas mulheres completamente diferentes, mas que estão ali uma pela outra, que se defendem, apoiam e, independente do que o futuro reserve para ambas, da distância que possa separá-las ou de qualquer outro fator, sempre serão melhores amigas. Após tantas provações, o laço entre elas se fortaleceu ao ponto de se tornar indestrutível.
Mas se a amizade com Chloe é para a vida inteira, o mesmo não pode ser – necessariamente – dito sobre seu namoro com Finn. Sejamos honestos, por mais doloroso que seja assistir ao término dos dois, ele é necessário. Rae errou ao não ser capaz de ser sincera com o namorado. Finn errou ao beijar Katie. Por mais incerto que estivesse seu status de relacionamento – ele e Rae haviam terminado, estavam juntos, estavam dando um tempo (we were on a break!)? – o garoto ainda cometeu um erro e isso é ótimo.
Bom, não ótimo no sentido de que é correto trair sua namorada, mas é importante por nos mostrar que Finn não é perfeito. Até aqui tínhamos essa ideia a seu respeito e o rapaz que era o único personagem que nunca havíamos visto errar. Ele era idealizado por Rae – e a própria menina admite que não era justo o modo como o pintava como o senhor perfeito, o príncipe encantado, seu salvador – e consequentemente pelo próprio público. Ainda assim, se há algo que My Mad Fat Diary nos ensina é que não existem pessoas perfeitas. Ser humano é ser falho e, embora isso não nos exima de nossos erros e responsabilidades, é necessário aceitar o fato de que nenhum de nós é e jamais será perfeito.
Sendo assim, Finn e Rae viveram uma história de amor linda e importante para ambos enquanto durou. Talvez eles voltem a se encontrar em algum momento no futuro e façam dar certo. Talvez não. Nada disso anula sua trajetória e impacto que tiveram na vida um do outro. Finn sempre será o primeiro amor de Rae, o primeiro garoto que a fez sentir especial, a pessoa com quem queria dividir seu baile de formatura. No entanto, naquele momento da vida os dois já não eram certos um para o outro. A garota descobriu que queria mais, que desejava deixar Lincolnshire, ampliar seus horizontes e conquistar outras coisas e que, acima de tudo, precisava parar de esperar que outras pessoas viessem salvá-las.
E é isso que torna o desfecho de My Mad Fat Diary tão maravilhoso e especial. Por mais lindos que Rae e Finn fossem juntos, essa série não era sobre o relacionamento dos dois, é sobre Rachel Earl. Portanto, vê-la amadurecer o suficiente para se validar sozinha, lutar por sua vida e seus sonhos e se transformar em sua própria heroína é lindo e inspirador. A garota sempre terá questões que precisará trabalhar, as dúvidas e os medos aparecerão de vez em quando e eventualmente ela irá precisar atravessar os cantos mais sombrios de sua mente e talvez hesite, tropece ou se machuque, mas irá sobreviver. Sua doença faz parte de sua vida e de sua jornada, não a define ou limita como um ser humano, mas está ali – às vezes quase imperceptível, às vezes transformando tudo em caos – e a menina precisa aceitar e lidar com isso. E Rae aceita. E Rae se aceita.
Embalada, então, por Creep do Radiohead , em uma sequência introspectiva e belíssima, vemos Rae finalmente dar adeus a Lincolnshire e seguir para uma nova aventura. Não é mais a garota que conhecemos dois anos atrás, saindo de uma clínica psquiátrica, ela cresceu, mudou e agora leva todos que fizeram parte desse processo consigo. Sua família, Chloe, Finn, a gangue, Danny, Tix, Kester e Liam estarão sempre com ela. Fazem parte de quem ela se tornou e, mesmo que alguns casos apenas na memória de seus dias de adolescente, nunca a abandonarão. Da mesma forma que Rae agora faz parte de nós e estará sempre aqui, nos lembrando que a vida não precisa ser perfeita. Mais do que isso, que as pessoas não precisam ser perfeitas.
Observações:
- A evolução da relação entre Rae e sua mãe também é muito interessante. Em nenhuma das temporadas o relacionamento das duas é perfeito, há sempre um problema, um conflito, alguma situação de tensão, mas também muito amor. Essa honestidade é uma das minhas coisas favoritas em My Mad Fat Diary. Tudo isso faz com que seja ainda mais lindo ver Linda dizer que não pode ir para a Tunísia, mesmo que isso seja tudo o que deseja, porque não pode abandonar seu bebê.
- A relação entre Kester e Rae é outra que merece destaque. Ela ultrapassa os limites profissionais, mas é nítido o carinho do psicólogo por sua paciente preferida e a importância que cada uma das sessões teve na vida da menina.
- Queria ter visto um pouco mais de Archie, mas sigo amando a amizade dele com a Rae;
- Na maior parte dessa temporada eu só quis colocar a Chloe em um potinho e protegê-la de todo mal. Deixem minha menina ser feliz!
- Karim é muito amorzinho. Ele dando a corrente para Rae foi lindo demais;
- As tatuagens de Chop e Izzy foram impagáveis. Melhor casal;
- Adorei Danny trabalhando no pub e interagindo com a gangue;
- A última cena da gangue no pub, com o Archie tocando e fazendo um paralelo com a primeira cena deles ali, me destruiu;
- A irmãzinha da Rae é muito fofinha;
- Pessoas que choraram no episódio final inteiro me add;
- Stan Ford Forever!