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Merlí

Por: em 15 de outubro de 2017

Merlí

Por: em

Merlí é uma produção catalã de 2015, exibida pela TV3 e estrelada por Francesc Orella que acompanha o dia-a-dia de uma turma de filosofia do ensino médio – sua primeira temporada está disponível na Netflix. Os “peripatéticos”, como acabam ficando conhecidos, são liderados por um professor de métodos pouco ortodoxos, mas que faz o que é preciso para despertar o interesse de seus alunos na disciplina e na vida acadêmica em geral. Um excelente mestre – ainda que um canalha em sua vida pessoal.

Merlí acerta em cheio na maioria das escolhas de roteiro e na abordagem dos temas centrais. É uma produção que questiona o modelo tradicional de ensino e apresenta alternativas criativas e críveis a ele. Retrata adolescentes de uma maneira responsável e realista, tratando de todas as questões referentes a essa fase da vida sem idiotizar e nem idealizar os personagens – o que ainda é, por incrível que pareça, raro.

A filosofia é aplicada na prática, com cada episódio abordando uma linha específica de um filósofo. Através destes conceitos, a turma encontra formas de lidar com questões como slutshaming, evasão escolar, bullying e gordofobia sem cair nos clichês que costumam ser usados para falar destes assuntos. Um dos maiores trunfos da produção é justamente conseguir encontrar uma narrativa interessante envolvendo aulas de filosofia que não pareça um crossover de Malhação e Telecurso 2000 de Filosofia.

Os personagens podem, à primeira vista, parecer encaixados nos estereótipos clássicos das séries ambientadas em escolas: o repetente problemático, a musa da turma, a gorda simpática e seu melhor amigo gay, o esquisito, a rebelde, o nerd, e por aí vai. Mas no decorrer dos episódios outras camadas vão se revelando, o público e os personagens vão percebendo nuances e mudanças que não se encaixariam no script pré-determinado daquelas representações. E é isso que torna impossível resistir à tentação de dar “play” no próximo episódio para saber o que vai acontecer em seguida.

Merlí Bergeron é parecido com vários outros anti-heróis que já vimos por aí, cheio de dualidades. É muito bom no seu trabalho, mas tem problemas de relacionamento com alguns colegas. É insubordinado e moralmente flexível, mas não se cala diante de injustiças. Trata as mulheres com quem se relaciona de uma forma terrível, mas nunca desiste de seus alunos, mesmo aqueles que todos consideram casos perdidos. Mais que um professor entre as paredes da sala de aula, Merlí cumpre uma função de educador na vida de seus alunos, fazendo-os encararem com maturidade a árdua tarefa de crescerem como seres pensantes.

A trama também mostra como as famílias, os professores e a direção da escola reagem aos novos métodos de ensino e aos desvios éticos de Merlí. Há uma ala mais conservadora que não abre mão do modelo tradicional de educação, há os que se encantam com o carisma do professor de filosofia e relevam todos os seus deslizes. O público é, desta forma, indiretamente convidado a fazer um exercício de reflexão sobre seus próprios valores, moral e ética para escolher lados, ponderar, julgar e perceber que nada é assim tão preto e branco na realidade. Não poderíamos esperar nada diferente de uma série que se propõe a falar de filosofia, né?

Merlí fica no meio do caminho de muita coisa. É engraçada demais para ser um drama, mas tem situações dramáticas demais para ser uma comédia. É leve demais para quem espera um roteiro mais denso e complexo, mas é ousada demais para assistir com a família sem rolarem alguns momentos constrangedores. Mas a qualidade não fica no meio do caminho, o resultado final é realmente interessante e merece a sua atenção.


Laís Rangel

Jornalistatriz, viajante, feminista e apaixonada por séries, pole dance e musicais.

Rio de Janeiro / RJ

Série Favorita: Homeland

Não assiste de jeito nenhum: Two and a Half Men

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