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The Walking Dead – 2×10 e 2×11 Judge, Juri, Executioner

Por: em 12 de março de 2012

The Walking Dead – 2×10 e 2×11 Judge, Juri, Executioner

Por: em

Who says we’re civilized anymore?

Desculpem pelos atrasos nas reviews, pessoal. Neste post, comentários sobre 18 Miles Out e Judge, Juri, Executioner.

Reconheço que o momento pelo qual The Walking Dead passa agora é necessário. As tramas desempacaram, os personagens estão crescendo e tudo converge para uma season finale que tem tudo para ser grandiosa. O problema é que a série parece ter dificuldade em trabalhar com o que tem nas mãos, e apesar de estar caminhando, o que entrega ainda é aquém de suas possibilidades.

Nestes dois episódios, especialmente 18 Miles Out, a série chegou muito perto de cumprir aquilo que prometera em seu piloto: ela foi intensa, foi gore, fomentou complexas discussões e ainda trabalhou o papel de seus personagens naquela organização social improvisada. Ainda assim, ela não foi completa. Por mais que se esforce, The Walking Dead ainda não conseguiu chegar ao mesmo patamar dos grandes dramas televisivos da atualidade.

Li muitas ressalvas plausíveis a 18 Miles Out, mas minha opinião continua a mesma do momento em que o assisti: que episódio exemplar. Ele não foi perfeito e nem o melhor da série, mas se todos os episódios dessa temporada fossem semelhantes a ele em qualidade, timing e dramaticidade, minhas reviews seriam muito mais positivas.

Os haters mais fervorosos podem dizer que, para um episódio fora dos padrões, 18 Miles Out não surpreendeu, já que os roteiristas têm uma liberdade criativa muito maior quando estão trabalhando fora da fórmula convencional e com cenários diferentes. Mas isso não se aplica aqui, pois o diferencial do episódio é exatamente sua limitação: os roteiristas tinham objetivos muito específicos para atender neste bottle episode, incluindo trabalhar com um orçamento reduzido, sem poder alterar muita coisa na trama, com poucos personagens e ainda dar uma chacoalhada naquelas que são, no momento, as principais tramas da série, isso em uma produção que carrega a responsabilidade de ser um fenômeno de audiência, que anda desacreditada pela crítica e com problemas de ordem monetária que não são segredos para ninguém. Quando se olha para 18 Miles Out do ponto de vista da produção, entende-se o quão desafiador foi este exercício, e o fato deste ter sido um dos melhores (se não o melhor) episódio da temporada surpreende.

A seu favor, ele tinha a grande carta na manga da temporada: Rick e Shane. Nenhum desvio da trama da graphic novel foi levado tão longe quanto essa situação. CDC, Sophia, Dale, etc. foram decisões interessantes, mas a permanência de Shane na história vem sendo crucial para o andamento da temporada. Além disso, ele mostra-se uma alternativa viável (o termo “ameaça” não se aplica, já que todos sabemos que a série não tem culhões para eliminar seu protagonista) à liderança de Rick, que é uma das bases estruturais da graphic novel. Achei necessária e muito bem executada a reserva de um episódio inteiro para lidar com o impasse entre os dois, especialmente após a decisão de Lori, no episódio anterior. Shane é tão presente na trama e é um personagem tão forte que, apesar do roteiro cheio de deficiências não deixar a menor sombra de dúvidas quanto a qual dos dois permanecerá na liderança do grupo, ele e Rick, aos olhos do telespectador, são dois lados de uma balança nivelada. Os dois nêmesis são yin e yang, ainda que em circunstâncias que não possibilitam a permanência dos conceitos clássicos de bem e mal.

Na conversa entre os dois, na estrada, uma interessante nova posição do roteiro em relação à Shane foi esboçada, avanço que foi prontamente deixado de lado no episódio seguinte, que voltou a optar pela vilania fácil – o que eu acho uma pena. Eu gosto de quando o personagem é retratado como alguém que sucumbiu àquela terrível realidade, é essa oportunidade de ser compreendido como um “sinal dos tempos“, que a HQ não o concedeu, que eu esperava da série. Felizmente, vimos muito disso neste episódio. Assim como Rick, ele é só um cara que não quer morrer, e que sente que precisa zelar por outras pessoas, fazer o que é melhor para elas. Ele vê um zumbi em seu reflexo no vidro partido da janela, vê outro vagando de maneira débil e desesperadora por um matagal e sente que aquele é seu futuro, e essa perspectiva o apavora, o leva à uma posição de ataque pouco racional. O problema é que o roteiro faz questão de esconder a humanidade do personagem embaixo de uma hostilidade exagerada, como se eles estivessem procurando por um vilão. Alguém que só toma atitudes ruins por impulso porque teme pela própria vida não fica conspirando para prender os atuais líderes de seu grupo (aliás, fico me perguntando quem, no lugar dele, consideraria essa ideia ridícula). Voltando à conversa dos dois, senti que ela se estendeu por tempo demais, mas acho que é porque o texto da série sempre me deixa entediado (aquela conversa do Rick com o filho depois da briga com Carol em Judge pareceu ter durado uns quinze minutos). Destaque para a fala de Shane: “começou com histórias esquisitas nos noticiários“. Eu queria muito que a série nos levasse a esse início do caos, sob o ponto de vista de cidadãos comuns.

Rick, por outro lado, vem ganhando minha simpatia. O público precisava torcer pelo Rick da TV como torce pelo da graphic novel. O personagem pode ser meio chatinho de se acompanhar quando o roteiro mostra seu papel de líder como um fardo (quem é que aguenta o climão das cenas dele com a Lori em Judge, Juri, Executioner?), mas agora, conseguimos enxergar um bom protagonista por trás disso. Gosto da atitude bad ass, do estrategismo (se bem que a ideia de matar a facadas é complicada na prática), de seus questionamentos morais. Nesta temporada, Rick enfrenta constante tensão e instabilidade, tem sua liderança questionada a todo momento, questiona a si mesmo se é realmente capaz de manter sua família a salvo e precisa lidar com com Shane, que agora assumiu uma posição declaradamente contrária à ele. Assim como fez com Shane, o episódio ilustrou visualmente o momento pelo qual o personagem passa, e eu gostei particularmente de duas cenas. Na primeira, Rick vê os corpos de dois policiais lado a lado, lembrando-o de que Shane é muito mais do que um simples problema que ele precisa resolver. Na segunda, Rick luta com três zumbis que estão caídos por cima dele, em uma cena cheia de significado e daquilo que a série domina: ação gore e efeitos visuais bárbaros.

Também me agradaram muito as explosões de 18 Miles Out. A série sempre parecia estar à beira de um clímax, e dessa vez finalmente vimos algo acontecendo. A luta de Rick e Shane foi mais animalesca do que muitos embates dos sobreviventes contra zumbis, e deu início àquela que é a melhor sequência da série até agora neste ano: Rick, Shane e Randall tentando escapar da horda de zumbis na delegacia. Além de eletrizante e divertida (achei um barato o Randall matando a zumbi que o atacou), ela ainda serviu para mostrar que Rick ainda tem uma bússola moral em perfeito funcionamento. É muito natural que ele se depare com questionamentos difíceis, como salvar ou não salvar Shane e Randall, afinal, como ele mesmo disse, não existem regras, nem respostas erradas. O mundo é uma savana, mas o protagonista ainda consegue tomar decisões baseadas em princípios civilizados.

Além dos dois, tivemos os conflitos na fazenda, com uma interessante discussão entre a pragmática Andrea e a conservadora Lori. Senti que aquilo tinha mais a ver com Shane do que com roupas para lavar e cômodos para varrer. Percebo que o roteiro tenta deixar Lori mais simpática, como na cena em que ela intercede por Andrea para Maggie, mas não adianta: eu não suporto a personagem. Com sua preocupação ridícula quanto aos afazeres domésticos, ela me lembrou a Marge Simpson, no filme da série: a casa está pegando fogo, mas antes de sair, ela lava os pratos sujos da pia. As futilidades que a personagem prioriza não contribuem para uma avaliação mais positiva de sua participação, mas seu posicionamento no conflito do episódio também é questionável. Não é como se ela pudesse prometer à Beth um futuro melhor, então para que iludi-la? Entendo que a irmã dela não queira participar do pacto suicida (tema que também cruza o caminho da personagem na graphic novel) e queira convencer a irmã a viver, mas Lori não tem nada a ver com o assunto. A posição de Andrea fez mais sentido para mim, deixando-a livre para escolher seu destino. E sério que a menina não foi infectada? Só estava em choque? Puts.

18 Miles Out quebrou o silêncio, marca registrada da série, ao terminar com uma balada indie sobre dependência emocional (ouça). Outro ponto digno de nota no final do episódio foi o curto momento que colocou o telespectador no ponto de vista de Randall, a nova semente da discórdia na fazenda. Focando-se nele, Judge, Juri, Executioner ficou muito atrás de seu eficiente antecessor. Eu gostei muito do conceito do episódio, e vi avanços na maneira como tudo foi conduzido: foi um episódio organizado, fechadinho, sem vácuos tão sem sentido quanto Secrets ou Chupacabra, mas deu para perceber que o episódio cometeu o mesmo erro de Pretty Much: sabendo que tinha uma bomba guardada para o final, pouco foi feito nos quarenta minutos iniciais. É interessante vê-los tentando julgar Randall de uma maneira humana, porém prática, a formação do júri informal, a discussão sobre como executá-lo e quem deveria fazê-lo, estes são os primeiros passos da reconstrução da civilização. O problema é que isso tudo foi retratado de maneira chata. Não empolgou.

Eu não consigo ver Randall como uma ameaça (por mais que eles tenham forçado a barra quando ele contou sobre o estupro), não entendo por que não retomam o plano de deixá-lo à própria sorte em algum lugar distante, não me importo se o personagem vai viver ou morrer e nem se vai ou não trazer um grupo rival para a fazenda (tá, eles matam o T-Dog e, com sorte, a Carol, e tudo volta a ser como era antes). Além disso, não podiam ter arranjado um advogado mais ineficiente para Randall: deixá-lo vivo é a atitude mais humana, a audiência estava do lado dele. Aí os roteiristas me colocam o Dale para representar este ponto de vista. O personagem parecia tão forçado no papel de ancião que luta para que o grupo não perca sua humanidade que vê-lo morrer ao fim do episódio foi um alívio. Sinto que sua patética rixa com Shane, que nunca chegou a levá-lo a sério, trabalhava contra o desenvolvimento deste plot.

Além disso, as discussões paralelas do episódio não convenceram. Então a resignação de Carol vem do fato dela ter uma religião? Pessoas religiosas também passam por luto, depressão e até mesmo loucura. A filha da mulher passou por terrores que dão nojo só de pensar, uma coisa morta-viva mordeu-a e ela agonizou de febre numa floresta por dias até morrer e se tornar um bicho canibal, ficou presa apodrecendo junto com criaturas semelhantes em um celeiro perto dela enquanto ela procurava-a, tentou atacar o grupo dela ao sair de lá, foi morta com um tiro na cabeça, e ela está bem com isso porque acredita que a menina está no céu? Não rolou. Para completar, ela ainda decidiu não tomar partido no grande debate da segunda metade da temporada. É praticamente um T-Dog mulher e com mais bagagem. E a discussão dela com a Lori pelo que um moleque de dez anos falou… de onde veio aquilo?

Falando em Carl, como esse moleque pentelhou nesse episódio. Chegou a libertar um zumbi e perder uma arma de fogo na floresta (aliás, que situação forçada ele se embrenhando no meio do mato sem motivo nenhum). A ideia de colocá-lo seguindo os passos do pai, tentando ser durão, é bacana, mas é outra coisa que os roteiristas precisam trabalhar melhor, para que ele não caia na extensa lista de personagens com os quais ninguém se importa. Falando nisso, parece que resolveram voltar a dar destaque para o Sawyer sujismundo. Ele tem falas, ele tortura, ele pratica eutanásia… um action man muito melhor e mais fácil de se simpatizar do que Shane, que perdeu totalmente a noção nesse episódio (sério, prender Rick e Hershel?!). A conversa entre Hershel e Glenn também não foi nem muito boa nem muito ruim (mais uma vez, o texto é fraco, e tem episódios em que eu só consigo me importar com um personagem se um zumbi estiver atacando-o).

Ainda assim, gostei de como estão abordando o tema Randall, uma trama pela qual eu não dava nada, mas que vem acrescentando muito para a temporada. The Walking Dead já trabalhou com busca por desaparecidos, suicídio, luto, aborto, pena de morte e agora eutanásia. É bacana ver como esse panorama apocalíptico transformou essas questões, desestruturando o que o senso comum atual determina sobre elas. O problema é que, por mais que a situação lhes dê a oportunidade de arriscar, eles optam pela alternativa mais comumente aceita como correta: a busca sem cabimento por Sophia continuou, Beth não se suicidou, Carol superou tudo, Lori não abortou, , Rick decidiu poupar Randall e Dale recebeu um tiro de misericórdia. Dessas situações, a menos discutível é a de Dale, em que qualquer outra alternativa seria desumana. Já nas outras, parecem uma certa covardia da parte dos showrunners. Se é para tocar em temas espinhosos dessa maneira cheia de dedos, deixe-os para produções que sabem o que fazer com eles.

Ainda assim, essa segunda metade da temporada está sensivelmente superior. Menos encheção de linguiça, mais progresso nas tramas, sequências de ação e drama muito bem dosadas e alguns momentos particularmente inspirados. O problema é que os defeitos de The Walking Dead, quando aparecem, se destacam tão gritantemente que não dá para fazer vista grossa para eles. A série segue um caminho promissor, mas precisa passar a reconhecer e a se livrar daquilo que atrapalha seu desenvolvimento, ou corre o risco de ter suas qualidades para sempre eclipsadas por suas falhas.

E você, tá gostando? E quanto às questões levantadas pelo episódio, como você lidaria com elas? Mataria Randall? Salvaria Shane? Teria deixado Beth se matar, ou considerado você mesmo o suicídio, naquelas circunstâncias? Compartilhe suas opiniões e pitacos nos comentários.

P.S.: Percebeu que tocaram no assunto das “pílulas do dia seguinte” que a Lori tomou para abortar? O assunto causou polêmica nos Estados Unidos, pois o remédio não é adequado para provocar aborto, o que foi visto como uma perigosa desinformação da parte dos roteiristas.

P.P.S.:  Spoilers dos quadrinhos nos comentários só com aviso na frente (“[SPOILER]” ou semelhantes). Do contrário, o comentário será excluído, em respeito a quem não acompanha a graphic novel. Comentários desprovidos de um mínimo de decoro também serão excluídos.


João Miguel

Bela Vista do Paraíso - PR

Série Favorita: Arquivo X

Não assiste de jeito nenhum: Reality Shows

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