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The Walking Dead – 2×12 Better Angels e 2×13 Beside The Dying Fire

Por: em 30 de março de 2012

The Walking Dead – 2×12 Better Angels e 2×13 Beside The Dying Fire

Por: em

Peço, novamente, desculpas pelo atraso nas reviews, culpa da falta de tempo de sempre aliada a problemas de hardware. Vamos lá:

The Walking Dead conseguiu terminar muito bem uma temporada repleta de irregularidades. Seus dois últimos episódios tiveram a coesão que fez falta na primeira metade da temporada: o propósito de cada cena era claro e a progressão da história fez-se palpável. Ainda que não livre de falhas, essa finale  foi muito satisfatória enquanto entretenimento e merece reconhecimento por ter introduzido na série o melhor arco dos quadrinhos, trazendo perspectiva a esse drama que, por diversas vezes nesta temporada, pareceu tão perdido.

Better Angels começou com o grupo prestando suas homenagens a Dale, mas uma vez contrastando o modo de agir de  Shane e de Rick (Rick sempre fica com a parte chata e Shane, com a parte cool). Não sou fã desses discursos “Jeff Winger” do Rick, mas a reestruturação do grupo proposta por ele é necessária. Eles não sabem ao certo se existe mais alguém vivo no mundo além deles, e até mesmo outro grupo poderia representar um perigo, como bem provou Randall. Fazer parte de um grupo agora não é apenas uma necessidade emocional, mas é crucial para manter-se vivo. E outra que é muito mais fácil para o telespectador simpatizar com um grupo unido, quase uma família, do que com um abalado por intrigas e tentativas de “golpes de poder” – não que o último não seja interessante, mas acho que o que a série precisa agora é fazer o público gostar de seus personagens. Deixe a política pós-apocalíptica para depois.

Ou seja, tentar unificar o grupo tem muito mais razão de ser do que sair por aí arriscando a vida para matar zumbis. Essa reação é compreensível (e muito mais bacana de se assistir), mas é como se eles estivessem sempre colocando o Shane como um representante da irracionalidade, da impulsividade perigosa. Hoje entendo que, desde o início, a ideia era fazê-lo enlouquecer, como nos quadrinhos. A diferença é que, na série, esta insanidade foi trabalhada passo a passo, os fatore  que o levaram àquele estado foram esmiuçados. A rejeição de Lori após a volta do marido, a perda do posto de líder do grupo, o que ele teve (teve?) que fazer com Otis, a descoberta de que Lori contou a Rick sobre os dois, diminuindo o relacionamento deles a um engano momentâneo e acabando com as chances dele tê-la de volta e, é claro, o medo primitivo compartilhado por toda a parcela viva da humanidade. Vendo por esse lado, a maneira como o roteiro da série trabalhou o personagem foi muito enriquecedora, em relação à HQ, que só deu uma pincelada no assunto.

Mas o que é mais interessante para uma série com as pretensões de The Walking Dead: um personagem que tenha uma posição contrária à de Rick baseando-se em argumentos racionais ou colocar como antítese do protagonista um personagem desvairado? Não é deixado a cargo do telespectador escolher um lado, o roteiro faz isso por você. O arco Shane foi transposto para a TV com um cuidado muito maior do que o que recebeu na obra original, mas o personagem poderia ter trazido muito mais para a série. Mas também me agrada o fato de que Lori e Carl não foram as únicas motivações de Shane: em sua paranoia, ele sentia que devia assumir a liderança do grupo novamente, assim como antes de Rick voltar, para “colocá-lo nos trilhos”. Por se tratar de uma questão maior do que o drama familiar novelesco e pelo momento pelo qual passava o grupo, a despedida de Shane não poderia ter sido em um episódio mais oportuno.

Mais uma vez, uma atitude agressiva de Shane tem como gatilho uma conversa com Lori. Abandonando sua posição de Lady Macbeth, ela agora tenta uma saída civilizada para o impasse, o que acaba desencadeando uma sucessão de acontecimentos que leva à morte de Shane, fato que a faz – vejam se pode – ficar revoltada com o marido. Gostei muito da atuação da Sarah Wayne Callies nessa cena. Engraçado que eu geralmente não sou muito fã do trabalho dela na série, mas logo em uma cena complicada como essa, achei que ela entregou uma interpretação tão verdadeira. E o mais importante é que essa indignação que todo mundo sentiu na hora em que Lori reagiu daquela maneira foi premeditada, os roteiristas contavam com isso. Eu vinha sentindo falta de demonstrações de controle sobre a trama, como esta, recentemente. Só dispensaria aquela rosnadinha do Rick no final da cena (eles têm que esfregafr tudo na nossas caras!).

Voltando a Shane, o plano arquitetado por ele me convenceu, e a sequência da floresta me agradou demais.  Tinha um clima muito instigante ali, o suspense das cenas mexeu comigo de verdade, por mais que o final fosse previsível. É fato que o momento não se apoiou só na expectativa construída em cima do desfecho da situação de Rick e Shane – só a cena em que Glenn e Daryl matam o Randall-zumbi já dá uma aula de suspense e tensão em 80% dos filmes de terror hollywoodianos recentes – mas o sucesso desse clímax é fruto de uma temporada inteira construindo a rivalidade dos dois, brincando com o que o leitor da HQ sabia (o Carl abatendo o Shane-zumbi no final foi a cereja do bolo).

Enquanto o caso Sophia sustentou a primeira parte da temporada, a segunda ficou a cargo de Shane. Ambas as storylines tiveram conclusões trágicas, pessimistas. Mas temos duas diferenças aí: a morte de Sophia, por ter pego os telespectadores de surpresa e se tratar de uma criança, causou muito mais impacto que a morte de Shane (eu adorei a cena, mas fala sério: alguém achou que o Rick ia morrer?). Em contrapartida, o desenvolvimento da história de Shane foi muito mais interessante de se acompanhar do que aquela caganeira aguada da busca por Sophia. Eu prefiro um bom desenvolvimento e um final satisfatório do que sete episódios de lenga-lenga e um final impactante. E outra que a história de Sophia valeu pelo choque causado pela saída da garota do celeiro e por um ou outro bom momento em Nebraska. Não rendeu (Carol que o diga). Já a morte de Shane promete ressonar por muito tempo na história, e seus primeiros efeitos já foram sentidos  logo em Beside the Dying Fire.

Beside mostrou a que veio logo em sua cold open. Além dá ótima transposição de uma horda de zumbis para a TV, passando a mesma sensação de asco que tivemos no início de What Lies Ahead, ela trouxe de volta um curioso elemento da primeira temporada: o helicóptero visto por Rick no piloto da série. Nos quadrinhos, ele levou a uma chocante sequência, e eu espero que o mesmo se repita na série. Também comemorei demais quando vi a encapuzada misteriosa e seus dois zumbis amputados de estimação à tiracolo – e que cena foi aquela?! Andrea matando zumbis na pedrada, no muque, na raça, no meio da floresta e, quando está para morrer, é salva pela personagem mais adorada dos quadrinhos. Melhor cena da temporada, sim ou com certeza? E o episódio ainda acaba com uma imagem do novo cenário, fomentando mais expectativas para a próxima temporada. Acredito que teremos uma terceira temporada muito gratificante para quem já leu os quadrinhos e de ótimas surpresas para quem só acompanha a história pela TV. E quando The Walking Dead sabe o que está fazendo e para onde está indo, o resultado é geralmente bom.

Voltando à Andrea e seus feitos, o maior acerto desta season finale foi esse: tornar os personagens mais simpáticos aos olhos do público através da ação. Rick abre o celeiro e provoca dezenas de zumbis, Carl incendeia-os, Hershel defende a fazenda com unhas e dentes, até Lori atira. Como eu já disse em outra review, eu só me importo com os personagens em cenas de ação e perigo. Em Beside,  parecia que ia acontecer o mesmo, mas aqui o efeito não passou quando os zumbis ficaram para trás. Todos mostraram tanta garra para sobreviver que foi impossível não se envolver nas cenas mais emotivas, em especial quando eles se reeencontram na rodovia, que já foi cenário de tantas angústias. Ninguém guardou luto por Jimmy e Patricia, mas já sabemos que este não é o ponto forte de The Walking Dead (apesar de eu ter gostado da conversa entre Glenn e Andrea sobre Dale, no episódio anterior). Além disso, se o público, por vezes, não simpatiza muito nem com o elenco principal, mostrar personagens chorando por figurantes seria um desperdício de screentime.

Já Rick revelando o que Jenner sussurrou não surtiu o efeito que deveria, considerando-se que os roteiristas guardaram essa cena por uma temporada inteira. Quem leu lembra do impacto que isso teve nos quadrinhos. Entendo que é complicado para a série guardar segredos desse tipo, mas o fato de ela não conseguir mexer com o telespectador ao reproduzir uma cena dos quadrinhos é um problema do roteiro. A questão aqui não é surpreender, e sim emocionar, e essa cena, ao tentar revelar esse ponto chave da trama como uma surpresa bombástica, não alcançou nenhuma dessas duas metas.

Com a morte de Shane, Rick recupera por definitivo o posto de protagonista e, pelo menos neste episódio, não fez feio. Desde a morte de Sophia, o roteiro vem tentando enaltecer o lado bad-ass do personagem, mas invariavelmente acaba voltando para o drama água com açúcar que é feito ao redor do papel dele enquanto líder do grupo, de sua responsabilidade para com sua família, etc. Felizmente, neste episódio tanto ação quanto drama funcionaram para Rick. Já em Better Angels a qualidade da abordagem do arco familiar me surpreendeu. Gostei muito do momento Rei Leão que ele teve com Carl (“I’m tired, son“). “Chega de coisas de criança” é a lição mais valiosa que Rick já passou para o filho durante a série toda, e perpetua essa nova fase pela qual passam os sobreviventes: pessoas morrem, o perigo é real, a vida não tem mais espaço para amenidades (viu, Lori?), é uma constante luta pela sobrevivência e, na projeção mais otimista do futuro, alguém estará lá para dar um tiro na sua cabeça quando você morrer.

Minhas mãos estão limpas” é outra frase-chave dita por Rick, a partir da qual podemos ter um vislumbre de como serão as coisas a partir daqui. O bom moço matou seu melhor amigo e não demonstra remorso por isso. Evitando (ou postergando) uma dispensável crise existencial, os roteiristas aproveitam este momento da trama, onde a liderança de Rick e a unidade do grupo estão ameaçadas, para deixar o Rick da série mais próximo ao dos quadrinhos, em atitude. Surpreendendo quem esperava um discurso conciliador ou outra medida mansa, Rick joga na cara de todos tudo o que teve que sacrificar para manter o grupo seguro e, reafirmando-se enquanto o defensor e provedor maior daquelas pessoas, coloca-se também como chefe daqueles que decidirem ficar sob sua tutela, procurando acabar de vez com os questionamentos às suas decisões. Nada mais justo, certo?

Não acredito que algum deles vá querer sair de debaixo da asa de Rick, não neste momento de incertezas e desamparo. Por mais que o episódio tenha pego leve nas discussões existenciais, ele conseguiu expor o pesadelo pelo qual passam os personagens, particularmente agora que a fazenda foi definitivamente anulada da série – vide a cena em que o grupo se reune na rodovia e não sabem para onde ir. A destruição daquele abrigo tornou a situação deles muito mais desesperadora e interessante, e a desesperança é o que marca essa nova fase do grupo. E é assim que The Walking Dead termina sua segunda temporada: seus personagens estão áridos e as perspectivas deles são sombrias, mas a série encontra-se em seu momento mais fértil desde seu início.

Entre os que esperam que The Walking Dead seja uma versão serializada de Madrugada dos Mortos, os que acham que todos que criticam a série esperavam mais ação e não estavam preparados para sua densidade (?) psicológica e os que não tiveram paciência com as deficiências da série, existem aqueles que acompanham pacientemente seu desenvolvimento, que enxergam seus problemas, mas também reconhecem quando ela progride. Entendo que esta temporada tenha entretido e agradado a alguns e sempre embasei minha insatisfação com argumentos que evidenciam as inconsistências do roteiro. Em sua reta final, essa temporada mostrou muito do que eu acho que faltou em seu início e na temporada passada. Quando assisti o primeiro episódio de The Walking Dead, eu encarei-a com seriedade, vi-a concorrendo a premiações e sendo apontada como uma das grandes séries do momento. A série teve um desenvolvimento, de certa forma, medíocre, e eu não conseguia mais vê-la sendo mais do que aquilo, melhorando a ponto de satisfazer as expectativas criadas em seu ótimo início. Depois dessa respeitável sequência de episódios, acredito que o que falta para The Walking Dead é trabalhar mais seu texto, focar-se mais no desenvolvimento de suas tramas e progredir enquanto drama. Audiência a série já tem de sobra, a crise nos bastidores foi controlada e chegamos àquela que pode ser a melhor fase dessa história. Quem sabe não encontraremos, na terceira temporada, aquele drama poderoso prometido desde seu piloto?


João Miguel

Bela Vista do Paraíso - PR

Série Favorita: Arquivo X

Não assiste de jeito nenhum: Reality Shows

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