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Vinyl – 1×03 Whispered Secrets / 1×04 The Racket

Por: em 16 de março de 2016

Vinyl – 1×03 Whispered Secrets / 1×04 The Racket

Por: em

Entender a motivação de Vinyl tem sido uma aventura mais interessante do que descobrir o que move os próprios personagens. Desde o começo, a série tem um propósito bem claro que é retratar os bastidores da indústria fonográfica nos anos 70, mas como ela deseja fazer isso é uma outra questão. Às vezes, parece que a vontade de Vinyl é mostrar que o cenário musical era movido com muita droga, álcool e sexo. Outras, que esse universo era cheio de pessoas “mal carácter” – inclusive nosso protagonista, Richie Finestra – e que ninguém conseguia se salvar. Mas, na maioria das vezes, Vinyl só quer se aproveitar das histórias do rock n’ roll para construir as próprias narrativas.

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Em Whispered Secrets, Alice Cooper (interpretado por Dustin Ingram) ganha um sub-plot inteiro quando Clarke tenta convencer o vocalista a sair da banda e assinar um contrato com a American Century Records. É estranho ver o funcionário menos talentoso da gravadora dialogando com Cooper e imaginar que alguém tão incopetente possa ter plantado a semente para uma das maiores decisões que a banda faria é ainda mais absurdo, mas a história tem um fim cômico e um objetivo frívolo. Cooper finge que compra o discurso de Clarke a princípio para se vingar de Richie, que marcou uma reunião com a banda e nunca apareceu ou se desculpou.

Não era preciso tanto para provar que Richie não conduz seu negócio com integridade – The Racket funciona muito bem para isso, mas esse plot mostra que em Vinyl os personagens ficcionais influenciam pessoas reais, quando o oposto devia acontecer com mais frequência.

O mesmo acontece na cena de abertura, em que Jerry Wexler, Berry Gordy e Neil Bogart, empresários do mundo da música famosos na década de 70, aparecem em uma cerimônia para premiar Maury Gold (Paul Ben-Victor) com um prêmio de “lifetime achievement“. Entre piadas e ironias, Richie é apresentado como “o cara mais legal da indústria fonográfica”. Vinyl não quer apenas provar que seus criadores e roteiristas entendem muito do assunto quando colocam Richie entre os aqueles que deixaram sua marca em gravadoras, mas clamar por relevância para si e para o protagonista. Importância que poderia ser adquirida com seus próprios personagens e sua relação com a música.

A cena mais tocante do episódio acontece quando Lester sentado sozinho no sofá de casa começa a sonhar com uma vida de sucesso que nunca teve. Na sua imaginação, a sua voz antiga sobrepõe a rouquidão e ele canta I Can’t Quit You Baby enquanto visualiza uma sala ensolarada cheia de discos de ouro pendurados na parede e o abraço de sua suposta família. Parte o coração quando a fantasia se desfaz e ficamos com o homem que perdeu a voz e tenta manter o amor pela a música.

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Outra cena interessante de Whispered Secrets fica por conta de Devon. A ex-modelo precisa arrecadar dinheiro para um grupo de bailarinas com quem ela trabalha. Como Richie não pode dar a quantia, ela decide pedir para Andy Warhol assinar um quadro antigo que ele pintou dela. No estúdio do artista, Warhol coloca Devon novamente diante de uma câmera e pergunta sobre o objetivo de sua visita. Durante a maior parte da cena, o foco fica na televisão que transmite as imagens de Devon em branco e preto. Aos poucos, Warhol vai aproximando o foco no rosto e assim consegue captar quando lágrimas ameaçam cair dos olhos dela.

A emoção de Devon não se explica com o jantar de caridade para as dançarinas que quer ajudar, mas no significado daquele trabalho e do objeto que ela vai doar. Em uma briga com o Richie, Devon desabafa que aquilo era tudo o que ela tinha e, mais importante, tudo o que o marido tinha deixado para ela fazer. “Isso é o que você jogou para mim como uma criança. ‘Vai brincar com a trupe de bailarinas, Dev’”, conta. E ali ela se encontra, se desfazendo do quadro que lembra seu ilustre passado e que serviu para enfeitar o quarto do casal durante tanto tempo.

O fim ou, pelo menos, o começo do fim do casamento de Devon e Richie é tema recorrente também em The Racket, onde vemos os clichês mais comuns de divórcio acontecerem sem nenhuma profundidade. Tem de tudo: terapia de casal, reunião com advogada e uma esposa nervosa descontando a frustração com a frigideira na janela da cozinha. Mas, na verdade, nenhum dos dois toma nenhuma atitude para acabar com o relacionamento que não funciona mais. Provavelmente, Vinyl esteja acumulando o sofrimento de Dev para liberá-lo no momento certo.

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No entanto, o personagem mais importante do quarto episódio é o escritório da American Century Records. Em The Racket, os negócios da gravadora se concentram no espaço e se ordenam em uma forma frenética para serem jogados no colo de Richie, que não consegue lidar com todos os problemas mas tenta da maneira que sabe.

Para isso, S.J. Clarkson, diretor do episódio, opta por takes longos que exibem todos os sub-plots do episódio: Hannibal (Daniel J. Watts), o cantor ficcional de funk que precisa ser cortejado; os Nasty Bits que depois de uma apresentação conturbada em Whispered Secrets vai assinar o contrato; e Lester que aparece para botar fogo literalmente na sala de Richie e surgir como o empresário da banda recém contratada. Elementos diferentes que se equilibram e funcionam em um episódio ágil. 

Enquanto isso, Richie ainda é inserido em uma investigação sobre um gangster que ele não tem nenhum envolvimento e em outra sobre o assassinato de Buck do qual ele tem muito para contar. Por enquanto, os investigadores apresentaram perguntas cômicas e muito vagas sobre o envolvimento do protagonista no crime, mas Richie corre no final do episódio para encontrar um álibi e se proteger de futuras acusações e do fantasma da culpa que vem assombrando seus pensamentos.

Whispered Secrets The Racket se apoiam em estrelas da música – reais e ficcionais – para um caminho narrativo mais seguro e realista. Nem sempre esse modelo funciona porque Vinyl precisa lembrar que tem personagens com histórias mais interessantes para contar, mas pelo menos, a série mostrou como deve seguir daqui para frente.

 

Outros comentários (e mais música!):

  • Vinyl é geralmente uma explosão de sons, logo o silêncio é reservado para momentos especiais. Em Whispered Secrets, Devon domina esses momentos de calma e intensidade; em contraposição ao marido que sempre está exposto a muito barulho.
  • Outro elemento usado para dar contraste entre Richie e Devon é a paleta de cores. Dev é mostrada com cores mais frias, enquanto o Richie é apresentado em cores quentes, como o amarelo e laranja.
  • Warhol: “Do you want me to sign your dress? They’ll buy that too.”
  • No piloto, Richie é atraído para o Bronx pelo som do DJ Kool Herc, que é conhecido como o pai do hip-hop. Ele aparece no terceiro episódio tocando “Funky Stuff” e “Jungle Boogie” de Kool and The Gang e “Get Up (I Feel Like A Sex Machine)” do James Brown. Em The Racket, Lester explica que o diferencial do DJ é tocar duas músicas ao mesmo tempo.
  • Como era de se esperar, algumas músicas de Alice Cooper. Entre elas: “Unfinished Sweet” e “I Love The Dead”.
  • “Hannibal we want you back” foi atribuída a uma banda também imaginária chamada Hannibalism, mas “Alright Lady (Let’s Make A Baby)” é creditada a Charlie Wilson, cantor de R&B e ex-vocalista da banda The Gap Band. Wilson também canta o refrão de “Bound 2” de Kanye West.
  • Para colocar na playlist: “Simone” por Milk Carton Kids, “Danny’s Song” por Neko Case, “Cry Baby” de Janis Joplin e “Sinnerman” de Nina Simone.

 

 


Nathani Mota

Jornalista, nerd e feminista. Melhor amiga da Mindy Kaling, mesmo que ela não saiba disso.

Salto / São Paulo

Série Favorita: Sherlock

Não assiste de jeito nenhum: Two and Half Men

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