Agora sim! Depois de um piloto morno, Shades of Blue dá suas primeiras pistas de que talvez esse drama não seja apenas mais do mesmo, afinal. Começando exatamente de onde se encerrou o piloto, Harlee tentava desviar qualquer possível suspeita discutindo com Woz sobre qual membro da equipe é mais suscetível a ser um delator, quando foi interrompida por Tufo, que relatou uma atividade suspeita de um veículo que circulava continuamente pelas proximidades de uma loja. Ao chegar ao local, o veículo torna a passar, dessa vez recepcionando os policiais com uma saraivada de balas. Uma distração conveniente para Harlee e incoveniente para o espectador que não se interessa por casos irrelevantes à trama principal. Felizmente, o caso é breve, ocupa pouquíssimo tempo de tela e serve como pretexto para uma discussão importantíssima, de que falarei adiante.

A trama principal foi desenvolvida de forma eficiente e empolgante. O suspense funciona (especialmente na angustiante sequência final, não por acaso, a mais longa até o momento), e a forma como Woz descobriu a mentira da parceira e amiga, vendo Harlee fazer o mesmo gesto de anos atrás quando questionada se ela teria plantado a evidência no carro do marido para incriminá-lo, foi uma boa sacada. Aliás, foi uma decisão importante e inteligente para uma série que já nasceu com cara de quem vai pro limbo: logo no segundo episódio vimos a suspeita de Woz contra a Harlee nascer e se desenvolver, algo que era tão óbvio que aconteceria, que não faria sentido prolongarem demais.

O recurso usado para nos revelar o passado da nossa protagonista também foi inteligente. Desprezando o uso de flashbacks, o showrunner Adi Hasak preferiu introduzir um novo acontecimento: a descoberta de que um promotor da cidade era um dependente químico põe em questionamento 92 casos julgados por ele, entre eles o de Miguel Zepeda, na época marido da Harlee. Essa decisão narrativa informa ao espectador que é importante conhecer o passado desses dois personagens e sua duradoura relação, mas que não se acostume com essas idas ao passado. Simultaneamente, serve para apresentar o promotor James Nava, que troca olhares com a detetive e que pode se revelar um importante personagem futuramente, seja como aliado ou oponente da Santos.

E que passado. Harlee pode ser uma mulher corrupta, mas ela entrou nesse jogo não por ganância, mas para proteger a sua filha. Já Woz, possivelmente não saberemos como entrou nessa vida: agora que o vimos se aproveitando da situação frágil de sua futura amiga, é certo dizer que ele simplesmente abraçou essa vida por proporcionar dinheiro fácil. Ele é um sociopata, ganancioso e vil, daqueles que tentam se justificar com argumentos cínicos, e parecem tentar convencer mais a si mesmo do que a outros de que aquilo que faz é pelo bem maior (pela defesa da cidade, nesse caso).

Não só a história da relação entre os protagonistas foi desenvolvida aqui. Dinâmicas interessantes, o desenvolvimento do restante da equipe e uma discussão relevante (aquela de que prometi tratar acima) permearam o episódio. Essa foi uma grata surpresa: algemado à mesa por Tufo para que permaneça em vigilância, Loman discute em certo momento sobre o papel da polícia na comunidade. Uma discussão interna entre dois policiais afro-americanos sobre o papel da polícia e até onde a truculência deve ser legitimizada não é algo que se veja todo dia na televisão, especialmente em uma produção de TV aberta.