Se o primeiro episódio foi uma imersão definitiva no submundo nova-iorquino de The Get Down, o 2º episódio da temporada foi uma oportunidade de conhecer melhor os personagens através da evolução de suas tramas. Talvez a palavra chave do episódio seja mesmo “evolução”. Quase todos os núcleos tiveram os sonhos e ilusões do fim do primeiro episódio em alguma ação prática, e isso agiliza uma trama que, com tanto tempo (são 12 episódios de uma hora na temporada, poxa) poderia se tornar vagarosa e entendiante. Que os deuses do hip hop iluminem para que os episódios sejam todos nesse ritmo.
Comecemos por Mylene. O fim do primeiro episódio nos deixou crentes (ha) que Mylene iria quebrar as amarras com as quais o pai a prende cedo ou tarde, só não esperei que fosse tão cedo – e tão “apoteoticamente”, vamos dizer assim. A construção de Mylene – através das ações ou do texto falado – às vezes soa muito próxima do clichê a la Rachel Berry de garota-talentosa-e-sonhadora-que-a-vida-insiste-em-atrapalhar. Desconsiderando o fato de que, bom, ela é exatamente isso, Mylene está envolta em um ambiente quase radioativo de preconceitos e atrasos que providenciam uma outra profundidade à personagem, e que foram muito bem explorados por esse episódio. Deus pôs a mão e tivemos com ela o melhor número da série até aqui na última sequência – mais uma vez palmas para a produção das faixas, porque essa ficou excelente -, mas até quando isso vai durar?
Mylene “ganhou” uma espécie de padrinho, e a figura de Francisco Cruz ganhou, nesse episódio, uma outra dimensão. Também facilmente cairia no clichê do político-populista-que-rouba-mas-faz, mas algumas coisas foram feitas talvez para evitar que isso acontecesse. Uma questão muito interessante que a série poderia aproveitar melhor em uma outra oportunidade seria o contraste entre ele e Fat Annie, cuja imagem representa basicamente o oposto da imagem de Chico. Enquanto Chico usa sua influência para o bem da comunidade (pelo menos em termos aparentes) e ajuda a carreira musical de Mylene, Annie manipula polícia e política para garantir seus negócios funcionando, além de assim que possível cortar as asinhas musicais de Shaolin Fantastic. Para se pensar.
Falando em Shaolin, a relação dele com Zeke e os outros garotos talvez seja o exemplo mais óbvio do que eu disse sobre “evolução”. Só que com um final bem mais aberto – e talvez triste – que a trama de Mylene. Primeiro, a junção de todos eles sob um mesmo nome (Fantastic Four Plus One); depois as bençãos de Grandmaster Flash e todo o tempo gasto com o treinamento de Shaolin, cada vez mais investido na ideia de fazer o seu próprio get down; e as letras de Zeke – agora Books – que fluíam com certa facilidade; tudo parecia em uma espécie de reta crescente. “Niggers got wings, niggers gota fly”, certo? Meh. Não. Com o incêndio – que, mais uma vez, traz à tona o aspecto político de The Get Down – encerramos a trama com o dilema de Zeke e Shaolin, significativo o suficiente: o que é preciso para chegar lá?
Explorado com um pouco menos de intensidade – e com um pouco mais de humor -, a questão das gangues ficou apenas pela conta de Cadilac tentando resolver as coisas do próprio jeito. Fiquei com um pouco de receio de o personagem virar um espécie de bobo da corte armado, mas o final da sequência na Les Inferno mostrou que ele ainda tem um peso muito grande na dinâmica entre a gangue de Fat Annie contra os Guerreiros Selvagens. Espero que o tema seja explorado com mais força nos próximos episódios – e eu aposto que vai, já que o incêndio coloca uma grande interrogação nesse núcleo também.
P.S.: Eu não me surpreenderia nem um pouco se Fat Annie tivesse encomendado o incêndio. Seria um belo dum plot twist. Ou talvez eu esteja vendo muita novela do Gilberto Braga.
P.S.2: Eu já falei o quanto Herizen F. Guardiola é maravilhosa? Vou repetir. E aquele glory note no fim da música? Emocionadissímo.