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1 Contra Todos

Por: em 14 de setembro de 2017

1 Contra Todos

Por: em

Spoiler Alert!

Este texto contém spoilers leves,

nada que estrague a série ou a sua experiência.

Com a lei de incentivo à produção nacional, várias produções poderiam sair do papel. Muitas delas não têm a menor pretensão de introduzirem uma ideia nova ou em mesmo de fazer sucesso. É por isso que uma série estoura na medida em que 1 Contra Todos fez, a gente tem que prestar atenção e dar os louros.

Reprodução/FOX

Cadu (Júlio Andrade) é um advogado de Taubaté que será pai pela segunda vez, mas perde o emprego devido seus princípios éticos. Para piorar sua situação, é injustamente preso ao ser confundido com o Doutor do Crime, maior traficante do país. Para tentar sobreviver, e com o apoio de sua esposa Malu (Julia Ianina), ele decide se passar pelo criminoso como única forma de sobreviver ao inferno da cadeia, enquanto quem está do lado de fora tenta provar sua inocência.

A série entra na pegada de sucessos como Carandiru, que mostram a vida na penitenciária, mas o foco é maior no relacionamento familiar de Cadu e Malu, o que é um diferencial importante. O foco aqui não é na vida difícil do sistema penal, mas como essa situação pode destruir ou unificar uma família, e até que ponto uma pessoa pode ir para manter as suas convicções morais intactas – ou em que momento elas se partem.

1 Contra Todos foi uma grande surpresa para a FOX em 2016. Desde sua estreia, a audiência do canal aumentou em 74%, tornando-se a segunda maior da rede, “perdendo apenas para The Walking Dead“, de acordo com Zico Góes, Vice-Presidente de Conteúdo e Desenvolvimento da FOX. Esses números foram suficientes para garantir a renovação para mais duas temporadas, algo extremamente raro de acontecer no Brasil.

Criação de Thomas Stavros (Polícia Federal – A Lei é Para Todos)  que divide os roteiros com Gustavo Lipsztein (Blue Lips). Todos os episódios foram dirigidos por Breno Silveira (Gonzaga – De Pai pra Filho). Conseguem perceber o que eles tem em comum? São todos homens brancos contando uma história com temática amplamente vivenciada por negros, mas falo disso mais adiante.

Reprodução/FOX

Uma das coisas que mais me incomodaram foi a ambientação temporal. Os eventos iniciam em 2001 (inclusive mostrando a final da copa do mundo de 2002), porém, muitas vezes fica a impressão que estamos na década de 90. O carro de Cadu é muito antigo e a falta de tecnologia (como a internet) é muito estranha. Pode ser que tudo não passe da minha falta de compreensão de como é a vida em uma cidade do interior, mas em vários momentos eu fiquei ponderando em qual ano a série se passava.

Outro erro são as soluções simplistas e um tanto quanto rasas para os problemas enfrentados por Cadu. Durante anos ninguém tinha nenhuma ideia de quem era o Doutor, mas foi apenas o Policial Federal Jonas ouvir às conversas dos traficantes mais uma vez para “descobrir” que o Doutor era médico e fazer a prisão no episódio seguinte? E nunca mais falam sobre essa peculiaridade do Doutor. Não faz sentido. Outra coisa muito estranha é o fato de um bandido tão proeminente ser mantido em uma prisão pequena em Taubaté. Imagino que ele seria encaminhado para uma prisão de segurança máxima com urgência, devido sua periculosidade.

Porém, o que mais me incomodou foi o tratamento dado aos presos negros. Todos sabem que a maioria da população carcereira brasileira é composta de jovens negros, menos na série, onde metade dos presos é branca (não apenas entre os principais, mas os figurantes também) e o único morto durante a rebelião é um negro. Pelo menos não cometeram o mesmo erro que a Globo ao colocar uma maioria esmagadora branca em sua prisão em Supermax, mas ainda assim, não ficou bem, principalmente pelo fato de não me lembrar de nenhum outro personagem negro que não fosse criminoso.

Reprodução/FOX

O elenco de apoio tem seus momentos de brilho, como Sílvio Guindane que estava incrível no papel de Mãe de Cela (seu papel era ser afetado ao estremo, mas em nenhum momento chegou ao mau gosto ou deboche por sua homossexualidade, mesmo com o machismo exacerbado dentro da cadeia) e Júlia Ianina, que me encantou com a sua Malu (e foi a única por quem realmente me interessei), trazendo a visão feminina à situação sem se deixar cair em uma posição vitimista.

Ao mesmo tempo, outros integrantes me fizeram passar vergonha alheia. Ainda não entendi o que Adriano Garib tentou passar com o seu Diretor Demóstenes (ele era homossexual enrustido ou sua afetação foi um erro de interpretação?), o Magrão de Júlio Machado chaga a ser bizarro de tão caricato, e o PF Jonas de Caio Junqueira tem a profundidade de uma lente de contato. Chega a atrapalhar o entretenimento? Não, mas tiram a atenção de outros momentos de maior carga emocional.

A série apresenta uma interessante curva de aprendizagem. Os dois primeiros episódios são muito sonolentos (e eu acho que deveriam ter sido condensados em apenas um), mas quando decidem deixar clichês de lado (qual foi a necessidade da cena dos presidiários andando no corredor com cara de mau, como se estivessem em um filme de ação?) então conseguem transmitir uma história interessante.

Reprodução/FOX

Meus momentos preferidos estão na relação de Cadu e Malu, que demonstra ser uma mulher extremamente forte e capaz de tudo para salvar a sua família, e é por isso que nos poucos momentos em que ela fraqueja e entra em desespero, nossa preocupação é genuína.

Porém, o que realmente engrandece a série é a introdução de Pepe. Em interpretação magistral pelo Uruguaio erradicado no Brasil Roberto Birindelli (interpretando um boliviano – deveriam ter arrumado isso ai, viu), todos os personagens se transformam ao seu redor. O traficante trás uma sensualidade e sensação de ameaça que estava em falta no início da temporada e finamente conseguimos ver um lado diferente do inicialmente bidimensional Cadu.

A série foi vendida como uma versão brasileira e Breaking Bad, mas esse não é tipo de série que eu acompanho, portanto, não sou capaz de opinar sobre a semelhança ou não. O fato é que, mesmo não sendo do meu gosto particular, consigo enxergar que o produto tem qualidade e entendo muito bem o sucesso com seu público alvo.

Conforme coletiva de imprensa que participamos semana passada, há uma mudança de direção criativa, fazendo com que se aproxime tematicamente a Scandal e House of Cards (pelo menos foi essa a impressão que tive), portanto é possível que minha percepção também modifique. Conversaremos mais sobre isso quando a temporada terminar de ser exibida.

Reprodução/FOX

Para encerrar, eu digo que 1 Contra Todos não é entraria na minha lista de séries com naturalidade, mas é um bom produto nacional que está se esforçando para melhorar e agradar ainda mais seu publico cada vez maior. Talvez estejamos vivenciando o início de uma produção que ganhe espaço internacional.

Vocês já assistiram à 1ª temporada de 1 Contra Todos? Os episódios estão disponíveis via app da FOX Premium. A 2ª temporada iniciou exibição semanal dia 11 de setembro às 22:30 e todos os 08 episódios já estão disponíveis no app. Quero saber o que pensam sobre a série e se acham que os novos episódios estão indo em uma direção interessante.


Paulo Halliwell

Professor de idiomas com mais referências de Gilmore Girls na cabeça do que responsabilidade financeira. Fissurado em comics (Marvel e Image), Pokémon, Spice Girls e qualquer mangá das Clamp. Em busca da pessoa certa para fazer uma xícara de café pela manhã.

São Paulo / SP

Série Favorita: Gilmore Girls

Não assiste de jeito nenhum: Game of Thrones

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