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Bates Motel – 5×10 The Cord (Series Finale)

Por: em 26 de abril de 2017

Bates Motel – 5×10 The Cord (Series Finale)

Por: em

Até agora não sei como começar a escrever essa review. Parte porque estou ainda tentando absorver o último episódio e parte porque desde que essa temporada começou, era com um pouquinho de tristeza que assistia ao desenrolar de cada capítulo, já sabendo que a cada um deles, restava um a menos para o derradeiro final. E então ele chegou. The Cord, encerra com coerência e maestria um seriado que desde o seu início mostrou muita coragem. Bates Motel deixou claro ao longo da sua trajetória (às vezes explícito, às vezes nas entrelinhas), que escreveria sua própria história e que portanto, Psicose e seu personagem central, eram inspirações para um novo olhar sobre a vida de Norman Bates. Sempre soubemos disso. Os sinais estavam todos ali, a cada novo episódio desta temporada, sendo um a um, escancarados pra gente. Sem enrolações, mimimi ou concessões. Mas ainda assim eu quis acreditar que o final de Norman Bates seria diferente. Que ele poderia ser internado e quem sabe, ter uma perspectiva de futuro mais normal. E é aí que eu acordo.

Reprodução/A&E

The Cord, como o próprio nome do episódio já indica, centrou sua história no corte do cordão que sempre ligou mãe e filho. Durante toda essa temporada, acompanhamos a evolução do nível da loucura e também a luta de Norman Bates. Primeiro contra “seus inimigos”, depois contra sua própria doença, em seguida contra o vínculo visceral que tinha com a mãe. Esse episódio nos mostra sua derradeira batalha e descortina de forma dura a realidade que o personagem viveu até aqui: a guerra de Norman Bates no fundo, sempre foi contra ele mesmo. E será que numa luta dessa complexidade alguém sai ganhando? The Cord provou, com muita perfeição, que não. Ao integrar Mother de forma permanente na sua própria (in)consciência e tornar-se dependente dela também no campo psíquico, Norman selou seu próprio destino. Sabemos que nada disso foi voluntário, mas temos noção também que foi irreversível.

Esse ciclo jamais se encerraria sem o embate entre Norman e Romero. O esperado confronto dos antagonistas foi carregado de tensão e adrenalina. Mesmo com toda densidade e agressividade das cenas, estava claro que esse não poderia ser o fim do garoto. O ex-xerife demonstrou, no decorrer da temporada, seu desespero ainda latente pela perda de Norma Louise e seu inconformismo com sua falta de pulso para impedir aquele final que no fundo, ele sempre soube que poderia acontecer. No tempo que permaneceu com Norman Bates, até descobrir onde Norma estava enterrada, ele teve milhões de oportunidades de matá-lo. E por que ele não fez isso? Talvez por estar cego pelo ódio, ou pela dificuldade em assimilar o que estava acontecendo (uma coisa é suspeitar, outra coisa é ver com os próprios olhos), talvez pelo horror de perceber o nível da loucura de Norman, ou até pela culpa de não ter conseguido salvar a vida da sua amada enquanto pôde. Não sei ao certo.

Reprodução/A&E

Alex Romero tinha o seu plano calculado e elaborado com frieza e riqueza de detalhes. Depois da morte de Jim Blackwell, teve que repensar sua estratégia. Mas ainda assim, ele foi persistente, capaz de sobreviver a vários contratempos e até mesmo improvisar diante de situações imprevisíveis. Acontece que seu plano meticuloso e bem montado não contava com o fator emoção. Afinal, dois anos foram suficientes para superar aquela morte e no fundo do seu coração ele já sabia como encontraria Norma, certo? Claro que não. Alex percebeu, no minuto que desenterrou a ex-esposa, que seu sentimento de perda ainda estava ali latente e pulsante, como se tudo tivesse acontecido naquele minuto. O diálogo que ele teve com ela, carregado de culpa e arrependimento, foi um pedido de desculpas, mas também, de certa forma, uma despedida. Naqueles segundos, matar Norman ficou secundário e pode ser que tenha até perdido um pouco o sentido. Nunca saberemos. Foi rápido, mas foi o suficiente para entender que para Romero o final chegou antes daquele ataque. Chegou quando ele compreendeu, fisicamente, a rigidez e irreversibilidade da morte de Norma Louise. 

Essa cena, para mim bastante emblemática, marcou também a despedida de mãe e filho. Foi nela que Norman corta de vez seu cordão umbilical e finalmente deixa sua mãe ir. Não sem tristeza, claro, mas com pouquíssima resistência. Para mim foi nítida a percepção dele que naquele momento ficou definido, sacramentado e aceito o final da sua jornada. Foi ali o adeus definitivo de Norman Bates. Acontece que, como vimos no decorrer da temporada, nos vários cenários criados pela sua loucura, partir daquela forma crua e fria, não faria nenhum sentido. Sua mente sempre precisou de beleza, conforto e segurança para ficar em paz. E qual o cenário que traduziria com perfeição esses requisitos? Sua casa, é lógico. Voltar pra casa, revivendo um dos primeiros diálogos do episódio 1 da primeira temporada, teve o gosto agridoce das partidas irreversíveis. Numa edição linda e sensível acompanhamos a última viagem da dupla, onde cenas de um garoto puro e um pouco triste, ao lado de uma mãe esperançosa e disposta a recomeçar, são contrapostas com a realidade de um jovem machucado e irremediavelmente perturbado, ao lado de um cadáver. Foi de arrepiar!

Reprodução/A&E

Dizem que para recomeçar, é necessário seguir em frente, sem olhar pra trás. E pensando um pouco mais profundamente, todo recomeço envolve necessariamente, uma despedida. Não só de pessoas, mas também de situações, comportamentos, lugares. Norman Bates fez tudo ao contrário. Ao optar por olhar pra trás e voltar ao local onde toda sua decadência começou, ele nos deu a pista principal de que aquele recomeço era, na verdade, uma partida definitiva. Que não teria sido completa sem a presença de Dylan. Desde antes de receber o telefonema, intuitivamente, parece que o irmão de Norman sabia que caberia a ele esse papel. Sua encomenda da arma, seu telefonema para Emma, sua necessidade de ouvir que existia alguém no mundo que o amava e para quem ele poderia voltar, também foram dicas de uma jornada que se encerraria no momento que ele entrasse pela última vez, naquela casa.

Mas claro que nada daquilo mesmo que intuído, seria fácil para o coração mais doce, puro e sensível de Bates Motel. Dylan sabia que a cadeia era o último lugar onde ele desejaria que seu irmão estivesse. Sabia também que a loucura de Norman atingiu níveis irrecuperáveis. Sabia ainda que ele jamais seria feliz internado para sempre numa clínica psiquiátrica. Mas mesmo assim ele quis fazer sua última tentativa. Assustado, apreensivo e já triste, com todos os motivos do mundo para ir embora e deixar tudo pra trás, ele arriscou a própria vida para viver aquilo até o final. Cabe dizer aqui que excluindo a loucura de todo o pacote, achei muito bonito o Norman fazer aquela ligação, falar o que falou, forjar uma receptividade carinhosa e aconchegante que Dylan, injustamente, nunca recebeu da mãe. Ao contrário. Na primeira ligação que ele faz a Norma, carregada de mágoa e raiva, já que ela e o irmão haviam se mudado sem ao menos comunicá-lo, foi tratado com bastante frieza e indiferença. Norman, talvez sem querer, deixou para Dylan outra memória para o seu recomeço. E mesmo com o final trágico daquela noite, sinto que no coração dele, ficou a certeza que o sentimento do irmão era verdadeiro.

Divulgação/A&E

O desfecho desse reencontro foi potente e arrasador. Norman se despiu totalmente na frente de Dylan, na “inocência e incoerência” da sua loucura. Tentou manter até o fim, a construção do cenário e família perfeitos, reunidos num jantar (macabro) de boas-vindas. Seu quase-ataque ao irmão, no último apelo de Dylan para que ele voltasse à realidade, foi fraco, desconcentrado e hesitante. Mother tinha mesmo ido embora e ele era só um fiapo do garoto normal e feliz que um dia acreditou ser.

E no abraço entre os dois, no choro do Dylan, no seu pedido de desculpas e especialmente, no agradecimento de Norman ficou nítido que só mesmo indo embora ele seria completo. Existir sem Mother era existir pela metade, algo que ele não cogitava nem com o suporte de um tratamento e medicamentos adequados. A sentença de Norman Bates foi selada no dia que Romero o salvou da morte. Era daquele jeito que ele queria ir embora, na presença de Mother. “É assim que isso termina, não é?” – perguntou a Dylan. Sim, Norman. É assim que tudo isso termina. Do jeito que você sempre sonhou. Num delírio que misturou memória e loucura, passado e desejo de futuro. Lindo, tocante, doce e triste.

Reprodução/A&E

Não poderia finalizar essa review, sem antes elogiar, mais uma vez as atuações maravilhosas e arrebatadoras de Freddie Highmore e Vera Farmiga. Os atores coadjuvantes cumpriram, com algumas exceções, muito bem o seu papel, mas o seriado sempre foi dessa dupla, que viveu com entrega e perfeição todos os desafios dessa jornada. Saudade já batendo de vê-los juntos naquela casa sombria, louca, assustadora, mas também afetuosa, que foi palco da relação mais intensa, problemática, polêmica e talvez verdadeira que pudemos testemunhar. Obrigada a todos que acompanharam nossas discussões até aqui. Não deixem de contar o que acharam desse final! Nos vemos numa próxima!

 


Renata Carneiro

Jornalista, amante de filmes e literalmente, apaixonada por séries. Não recusa: viagem, saidinha com amigos, um curso novo de atualização/aprendizado em qualquer coisa legal. Ama: família, amigos, a vida e seus desdobramentos muitas vezes tão loucos Tem preguiça: mimimi

Belo Horizonte/MG

Série Favorita: Breaking Bad

Não assiste de jeito nenhum: Two and a half Men

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