Hannah chega a um edifício elegante de Manhattan, provavelmente localizado no Upper East Side, para visitar o célebre autor Chuck Palmer. Ídolo literário da protagonista, Palmer é acusado de assediar garotas universitárias, enquanto viajava em turnê promocional de seu livro, e Hannah escreveu um artigo sobre ele para um site feminista. Logo no início do episódio, percebemos que American Bitch é diferente de tudo que Girls nos apresentou até agora. Estamos infiltrados num apartamento desconhecido e não sabemos o que vai acontecer.
Num diálogo que durou 26 minutos na TV (e algumas horas na “vida real” dos personagens), somos bombardeados por questões latentes que envolvem abuso de poder – seja na palavra da internet, na fama ou no sexo. A genialidade de American Bitch, escrito pela Lena Dunham, está na incerteza do final: não sabemos se Palmer sempre planejou aquele desfecho ou não. O olhar azul e indecifrável do personagem foi um acerto do casting, que escalou Matthew Rhys (The Americans) para o papel. Cada telespectador terá sua verdade pessoal.
Para mim, Chuck Palmer já havia esquematizado todo o roteiro, como uma espécie de “serial killer” que conhece as etapas de sua presa. Convidaria Hannah para seu apartamento a fim de provar que ela, assim como Denise e as outras garotas do Tumblr, deixaria a palavra “consentimento” em xeque quando aceitasse seu convite para deitar na cama. Palmer não parece temer por sua credibilidade como autor; sua maior preocupação é que a filha, Miranda, descubra seus affairs através da internet. É uma causa nobre, que humaniza o personagem, mas insuficiente para alegar inocência. Ele precisa de mais.
Ainda na biblioteca, Hannah e Palmer estavam distantes. Da cozinha à sala de estar, começaram a se aproximar. Ele usou seu charme para elogiar e demonstrar interesse na vida pessoal da protagonista – o que, obviamente, foi a chave para desarmar a carência de Hannah. A garota já estava sorrindo. Flertando. Feliz. O próximo passo seria levá-la para o quarto e, ahm, tirar o “amiguinho” de dentro das calças. Confesso que percorri o episódio inteiro, junto de Hannah, oscilando entre confiança e dúvida, mas nunca imaginei a exposição grosseira de Palmer. O mundo ainda está longe de qualquer conto de fadas. Que bom que a TV também exibe essa realidade.
Depois de tantos diálogos impecáveis, American Bitch conseguiu se superar e criar um desfecho ainda melhor. A pequena Miranda chegou ao apartamento na hora H e, como se não fosse o bastante, convidou Hannah para assistir à sua apresentação de flauta. A música de Rihanna, Desperado, foi um toque especial neste episódio. Tivemos a oportunidade de ver o lado B de Chuck Palmer, enquanto admirava a filha, com o olhar azul, antes de Hannah ir embora. Na rua, outras mulheres cruzam o caminho de Hannah e invadem a portaria do edifício de Palmer. Mais presas. Um novo ciclo.