A segunda temporada de Demolidor, que estreou no dia 18 de março no Netflix, deu início ao complicado relacionamento entre Matt Murdock e Frank Castle (ou se preferir, Demolidor e Justiceiro). Na minha opinião, os dilemas em torno dos dois personagens foram o ponto alto desta temporada. Ora como inimigos e ora como aliados, eles nunca estiveram em lados diametralmente opostos. Ambos possuem um senso de justiça e desejam uma Hell’s Kitchen melhor.

Na primeira temporada, Matt Murdock desmascara Wilson Fisk. Fisk é um empresário ambicioso, que pretendia seguir carreira política enquanto estava envolvido com diversos grupos mafiosos, com o tráfico de drogas e de pessoas. Nesta temporada, uma das primeiras ações do Justiceiro é exterminar um grupo da máfia irlandesa. Há uma similaridade nas atitudes de Matt e de Frank, mas eles não tem exatamente os mesmos objetivos. No começo da série somos levados a acreditar que o Justiceiro existe porque está seguindo o exemplo do Demolidor. Ou seja, que a mera existência de um herói mascarado que retira os bandidos das ruas de Hell’s Kitchen inspirou este novo personagem. Entretanto, diferente do seu predecessor, Frank não quer levar os criminosos para a justiça, ele quer dizimá-los para sempre. É neste ponto que a opinião pública está dividida, de um lado há pessoas que acreditam na lei e na aplicação da justiça, e de outro há pessoas que acreditam no justiçamento e na frase que diz “bandido bom é bandido morto”.

Matt Murdock estabeleceu um limite: Ele bate, tortura, mas não mata. Enquanto o Justiceiro não está muito interessado em torturar ninguém. Ele quer exterminar bandidos. Esta diferença crucial é fruto das motivações dos personagens. O que move o Demolidor é o desejo de dar segurança aos indivíduos de Hell’s Kitchen e livrar a cidade da corrupção dos poderosos. Além disso, há a questão da religião católica que condena o assassinato (ainda que na vida real a religião seja a causa da morte de muita gente). E acima de tudo, Matt é advogado. Ele busca a justiça através do sistema. O Justiceiro, por outro lado, é motivado por uma raiva muito profunda. Ele guarda um desejo de vingança por ter perdido toda a sua família, sua esposa e seus dois filhos, em um tiroteio supostamente entre bandidos. Na verdade, surgimento do Justiceiro não foi inspirado pela existência do Demolidor. As ações do justiceiro são norteadas por um gatilho emocional que modificou o seu estado mental e sua humanidade.

É curioso que não seja o justiceiro assassino que utiliza a máscara para se manter no anonimato. Frank não tem mais a quem proteger, as pessoas que ele amava já estão mortas. Já Matt Murdock tem muito a perder, com a máscara ele pode perder o amor de Karen e a amizade de Foggy. Porém, não usar a máscara poderia custar as suas vidas. É interessante notar que Frank começou uma amizade com Karen nos últimos episódios da série. Ele, que até então apenas tentava matar, passou também a proteger alguém. É possível que nas próximas temporadas ele comece a se importar com algumas pessoas novamente. Será interessante acompanhar alguma transformação no Justiceiro.

Mesmo com todas as diferenças, há um respeito mútuo entre os dois personagens.As circunstâncias permitiram que um pudesse entrar um pouco no universo do outro. Em parte, por causa da presença de Elektra na vida de Matt e de Karen na vida de Frank. Elektra é uma assassina, mas também uma pessoa a quem Matt ama e respeita. Alguém com quem Matt pode ser ele mesmo o tempo todo. E Karen é a única pessoa com quem Frank é capaz de se abrir e ser completamente honesto. É Karen que mostra para ele que a vingança cega não é o caminho para a verdade. Assim, Justiceiro e Demolidor, começam a enxergar mais tonalidades dentro deste embate ideológico.

Mas afinal, quem está certo? O dilema ético de exterminar uma vida sempre vai existir, mesmo que dentro de aparatos legais como a pena de morte. O limite é definido dentro de cada sociedade. Matar bandidos em Hell’s Kitchen é enxugar gelo. Sempre haverá novos grupos, novos cartéis, novos mafiosos, políticos corruptos, empresários gananciosos explorando o povo. Mas mandá-los para um sistema falido tampouco resolve o problema, como nos mostrou Wilson Fisk na metade final da temporada. Talvez o Matt da terceira temporada devesse focar um pouco menos nas ruas e um pouco mais nas instituições, livrar a cidade da corrupção policial, das arbitrariedades cometidas pela justiça, tentar melhorar o sistema para que ele possa de fato dar uma segunda chance às pessoas e não levá-las irremediavelmente para o crime.

– E você, leitor? vê mais diferenças ou similaridades entre Demolidor e Justiceiro

– O que você espera da terceira temporada de Demolidor?