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Lights Out

Por: em 13 de janeiro de 2011

Lights Out

Por: em

Lights Out Patrick Leary

Histórias sobre lutadores são tão tradicionais em Hollywood que quase dá pra formar um gênero exclusivo só pra elas. E por mais que isso abra espaço pra um número enorme de clichês sendo jogados na nossa cara a cada vez que um trabalho novo do tipo surge, eles não param de ser produzidos, porque quando são bem feitos, eles sempre funcionam. É fácil torcer por uma história de superação, ainda mais quando o protagonista pra chegar onde tem que chegar, é obrigado a encher de porrada os seus principais antagonistas. É empolgante, deixa a gente aflito, com o coração na mão. E quando a história sabe ir além, também deixa a gente cheio de nós na cabeça a respeito das consequências que tudo isso traz. O conflito entre a violência dos ringues e o amor da família já foi explorado um trilhão de vezes no cinema, só que Lights Out traz consigo a possibilidade de sua trama serializada tornar esse clichê muito mais envolvente — ou extremamente cansativo, caso a coisa não dê certo.

Mas Patrick ‘Lights’ Leary não é Rocky Balboa. Ele criou um nome pra si, ganhou campeonatos, mas foi sucesso à curto prazo, só 9 meses com o título mundial. Depois de uma derrota aparentemente injusta que quase o matou, Lights cedeu ao ultimato da esposa e se aposentou cedo, pelo bem de seu casamento — e de suas três filhas. A série se passa 5 anos após a aposentadoria, e por mais que todo o reconhecimento que Leary ganhou durante sua carreira tenha permitido uma vida confortável pras pessoas ao seu redor, toda fama tem prazo de validade. Pelo menos a fama rentável pro padrão de vida que Lights vive. Uma casa enorme, todas as filhas em colégio particular, uma academia pro seu pai (Stacy Keach, Prison Break) continuar treinando novos boxeadores… Lights não é um cara ganancioso, mas cinco anos depois de desistir dos ringues, os trabalhos que chegam até ele ou não dão grana o suficiente pra manter tudo o que ele tem, ou partem pra um caminho que ele não quer voltar — ou pelo menos diz que não quer voltar.

Porque o que Lights quer mesmo é voltar a bater. Não é vingança. Não é sede de sangue. Não foi isso que o piloto passou. É simplesmente a vontade de voltar a fazer o que sabe. No final do episódio, ele se irrita com a maior oportunidade que surge pra sua volta aos ringues, mas a irritação é só ele tentando enganar a si mesmo. Ele se segura porque sabe que sua esposa não quer vê-lo cheio de sangue de novo. Porque não quer que sua filha caçula morra de medo ao assistí-lo lutar. É legal pra caramba como só em um episódio a série já joga em seu protagonista uma decisão pesada dessas — e sem nada soar corrido ou exagerado, porque em 40 e poucos minutos houve um equilíbrio muito inteligente entre as duas paixões de Lights. E boa parte disso é crédito de Holt McCallany, que sabe vender bem pra caramba tanto uma pose extremamente carinhosa, quanto uma presença fortíssima só com o olhar.

A série precisa que ele seja versátil assim porque o boxe não parece ser o ponto central de Lights Out, mas sim a família do cara. Um pouco da relação com cada um dos Leary já foi mostrada: a esposa e a caçula toda bonitinha que eu já comentei antes, a filha mais velha no auge da adolescência, a filha do meio semi-nerd, o pai com pose de durão (mas que ama o boxe e a academia que Lights construiu), e uma das peças principais pro avanço da trama: o irmão, Johnny (Pablo Schreiber, The Wire), que comanda a grana e os negócios de Lights. E ao mesmo tempo em que o piloto estabelece todos esses personagens, ele ainda precisa nos mostrar a relação que Lights tem consigo mesmo — que é muito menos cuidadosa do que a que ele carrega com a família. A luta que o fez se aposentar ainda traz sequelas, e voltar a lutar significa aumentar as chances de algum problema sério acontecer. Perda de memória, demência, Parkinson. O diagnóstico é impreciso, mas grave.

Lights Out Patrick Leary

E não é só com a saúde que ele precisa tomar cuidado. Ao redor de tanta coisa acontecendo, o psicológico do cara é tão importante quanto o físico. A cabeça dele pode explodir a qualquer momento, com qualquer um. Leary não é uma pessoa violenta, mas é cheio de espasmos de agressividade. É só puxar um pouquinho além da conta. E seu próprio ego também não tá lá em cima. Em dois momentos do episódio, o personagem usa da fama decadente pra tentar escapar de uma situação embaraçosa, mas não adianta de nada. É fácil esquecer quem ele é. Cinco anos é tempo demais pra se ficar fora dos holofotes, ainda mais no universo do esporte onde tudo sempre se renova tanto, a todo momento. Lights não é nenhum Kenny Powers, mas já conheceu a fama por tempo o suficiente pra que ela seja pelo menos um pouco determinante na sua eventual escolha de voltar aos ringues.

Resumindo tudo, ó só o malabarismo que Lights tem que fazer: família, saúde, dinheiro, orgulho próprio, amor ao esporte… São muitos fatores que a série pode trabalhar de diversas maneiras — e todas elas me deixam empolgado pro que a temporada tem a mostrar. Uma série me conquista muito quando tem vários elementos na mão, mas usa cada um deles com calma, com naturalidade. O piloto de Lights Out fez muito em pouco tempo, mas soube conectar tudo isso ao redor de seu protagonista, deixando a coisa mais uniforme. A série não é sobre a família Leary no sentido de que o irmão, a filha, a esposa, a outra filha, o pai e mais uma filha dividem na tela histórias diversas, mas no sentido de que todo mundo é essencial pra que Patrick Leary volte a se descobrir. E seja qual for o primeiro passo nessa nova fase de sua vida, o treino com o sobrinho já o fez lembrar de uma dica valiosa.

Gotta remember to breathe.

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P.S.: FX já virou um dos meus canais favoritos. E olha que eu nem vejo Sons of Anarchy. Só ano passado eles estrearam Justified, Louie, Archer e mesmo que já cancelada, Terriers. 2011 começou bem pra eles de novo (pelo menos criativamente, porque a audiência dessa premiere não foi lá tão boa.)

P.S. 2: Eu preferi não comentar no texto porque o ‘Primeiras Impressões‘ geralmente considera que o leitor ainda não assistiu à série, mas o piloto usa uma cronologia quebrada que funciona muito bem. Não é nem exatamente pra causar surpresa, mas pra enfatizar tudo o que o protagonista tá passando. (Apesar disso, ficou uma ambiguidade gigante a respeito da derrota derradeira de Lights. Será que foi injusta mesmo?)

P.S. 3: Amei a trilha sonora.

P.S. 4: Eu tô cheio de vontade de pegar essa série pra fazer review semanal, mas é meio desempolgante escrever sem pelo menos uma pessoa ou outra pra gerar uma conversa nos comentários, por menor que seja. Ainda não sei, mas esse episódio e o meu tempo livre por causa das férias da faculdade já me deixam tentado.


Guilherme Peres

Designer

Rio de Janeiro - RJ

Série Favorita:

Não assiste de jeito nenhum:

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