Quando escrevi as reviews de Game of Thrones temporada passada, eu era totalmente leigo no universo criado por George R.R Martin. Hoje, quase um ano depois, o cenário mudou. Li os 4 primeiros livros de “As Crônicas de Gelo e Fogo” no intervalo entre as duas temporadas, estou pra lá da metade do quinto e, a despeito de algumas pequenas ressalvas que não convém comentar, tornei-me fã de Westeros e do complexo jogo que Martin criou. É difícil explicar, mas o que me prendeu à história foi exatamente a mesma coisa que fez com que eu me apaixonasse pela série durante as duas primeiras temporadas: A costura da trama, o teor psicológico e a dubiedade de praticamente todos os personagens, renegando o maniqueísmo comum a muitas histórias épicas.
Valar Dohaeris deixa isso bem claro em todas as ações retratadas, mas, acima de tudo, solidifica o crescimento dos personagens da série – algo que é fator primordial pra que qualquer trama, seja lá qual for o formato, funcione.
Sansa e Tyrion, por exemplo. São dois dos personagens mais interessantes da série, cada qual a sua maneira. A Stark, embora tenha a companhia de Shae e possa assistir navios indo e vindo de Porto Real, sente-se presa (e o é). Tudo em Sansa denuncia sua urgência em fugir para longe daquele lugar que, um dia, ela tanto sonhou em estar. O olhar vazio, o modo de falar, até a apatia no jeito de andar. Ela viu o pai perder a cabeça na sua frente, achava que Arya estivesse morta e acredita que perdeu Rickon e Bran. Não sabe o paradeiro da mãe e do irmão mais velho, mas sabe que seu ex-futuro-marido quer a cabeça dos dois numa bandeja. Dessa maneira, é perfeitamente compreensível que ela aceite qualquer ajuda que lhe for oferecida, mesmo a de Lorde Baelish, um dos homens mais espertos (e mais traiçoeiros dos Sete Reinos).
Já o anão, é provavelmente a pessoa mais amargurada dentro de Westeros, mas alguém pode culpá-lo? Ele agora carrega uma cicatriz exposta na carne, mas, antes disso, muitas outras (internas) já existiam. Fica claro em suas conversas com Tywin e Cersei o quanto ele sofreu com o desprezo que lhe é imposto desde criança, seja por sua condição de anão ou por sua mãe ter morrido ao lhe dar a luz. Agora ele perdeu o posto de Mão do Rei, viu seu próprio pai negar-lhe Rochedo Casterly, seu por direito e, na teoria, não tem mais nada a perder – o que o torna uma das figuras mais interessantes na atual configuração do Jogo dos Tronos. Blackwater e o pai tiraram-lhe o sorriso irônico do rosto. E dizem que nada é mais perigoso do que um homem que perdeu sua alegria.
O jogo de Tyrion é psicológico. Ele sabe que não pode ganhar de Cersei ou Tywin na força ou pela comoção, então apela pra cabeça, aquilo que ele sabe usar melhor.
O que o coloca em vantagem, seja lá para o que ele decida fazer, é a presença de Margaery em Porto Real, claramente apenas tolerada por Cersei. O grande defeito da irmã de Jaime é, talvez, pressupor que todos são idiotas e facilmente manipuláveis como Robert, a quem ela enganou a vida inteira. Não, não são. E os Tyrell muito menos. Loras e Margaery sabem que só tem a ganhar com o casamento arranjado da garota com Joffrey, assim como Porto Real, que não arriscaria perder o apoio de Jardim de Cima. Uma guerra silenciosa já está declarada entre a Rainha Regente e a futura Rainha de Westeros e Joffrey, como bom covarde que é, nada faz para interferir. Continua se escondendo atrás de guardas e grades, acreditando que ser rei se resume a mandar e desmandar.
E na batalha, Margaery sai na frente por ter algo que Cersei não tem: Carisma, o que a torna bem quista diante dos olhos de Westeros.
Jon Snow – que após a leitura dos livros, se tornou meu personagem favorito, devo acrescentar – é mais um que vai ter que jogar com o carisma para conseguir convencer Mance Rayder e os selvagens que, agora, é um deles. Jon é esperto, mas tem contra si suas emoções (agora representadas por seus sentimentos por Ygritte) e seus ideais, aos quais terá que ferir se quiser concluir com sucesso a missão que lhe foi deixada. A seu favor, o rapaz tem força de vontade. De sobra.
Coisa que falta a Stannis após a derrota em Blackwater. O rei em Pedra do Dragão viu boa parte do seu exército ser devastado e teve que recuar, deixando Joffrey no Trono. O mais interessante de sua história, contudo, não é em nenhum momento seu desejo de reaver o que acredita ser seu por direito, mas sim o conflito abertamente declarado entre Davos e Melisandre, imprevisível, categórico e desleal, já que por mais que aprecie a lealdade cega de Davos, Stannis não enxerga um palmo a frente do nariz quando se trata de Melisandre, muito disso por culpa da obsessão por tomar o Trono de Ferro para si.
Já a Robb Stark, o autoproclamado Rei do Norte, a obsessão vai se transformar em um ainda mais forte desejo de vingança. No olhar de Robb, ficou claro o quanto ver Harrenhall e os nortenhos daquela maneira mexeu com tudo nele. Mandar prender Catelyn pela libertação de Jaime foi a prova disso.
Do outro lado do Mar, a Rainha dos Dragões continua sendo a personagem mais curiosa de se observar. Sua motivação ao Trono é mais forte que a de Stannis, Joffrey ou Robb – se aproximando um pouco deste último. Dany quer reaver o que um dia foi de sua família e Robert tirou a força. O mais bacana daqui foi ver que ela finalmente entendeu que não vai conseguir tomar Westeros apenas com dragões. Contudo, ela ainda precisa trabalhar o mesmo que Jon: Suas emoções. Para reivindicar o trono que era de seu pai, ela vai precisar ser dura, fria, tudo que ela tenta ser, mas não consegue – como ficou claro no encontro com os Imaculados.
Talvez a chegada de Barristan traga a ela o que precisa.
__
PS. Queria pedir, mais uma vez, pra galera que leu os livros se controlar um pouco e não postar spoilers nos comentários. Tem muita gente que ainda não leu e certamente não quer saber o que vai acontecer.
PS². Não vou ficar comparando livro e série, porque são coisas diferentes, mas vez ou outra vou fazer algum comentário (aqui nos PS’s mesmo) a respeito. Sobre esse episódio, a única coisa que eu quero comentar é que, por mais que eu tenha adorado a chegada de Sor Barristan (um dos meus personagens favoritos), acho que se o suspense tivesse se mantido um pouco mais, como nos livros, sua entrada seria mais impactante.