A primeira temporada de In The Flesh terminou, me deixou com lágrimas nos olhos e a certeza de que é a melhor estreia de 2013 até agora. Dominic Mitchell produziu, com base em algo aparentemente tão comum (zumbis estão na moda) uma história tocante e repleta de metáforas, capaz de falar de muito, mostrando tão pouco. É impressionante como a série conduz nosso pensamento até nas cenas que não são mostradas e, ao mesmo tempo, expõe tantas mazelas da nossa sociedade. Uma série bem escrita, bem atuada e dirigida.
Sempre tive medo do que pode acontecer com um portador da síndrome que não toma seus remédios em dia. Ver Kieren andando pela cidade me fez pensar que talvez fossem mostrá-lo no estado zumbi-ataca, mas felizmente isso só aconteceu nos flashbacks. O garoto acabou entrando no supermercado onde matou Lisa Lancaster. O episódio passado tinha me deixado curiosa pra saber porque Jem tinha tanta mágoa do irmão, se era apenas por ele ter se matado. E de repente tudo se encaixa. Jem presenciou Kieren devorando o corpo de Lisa e simplesmente não conseguiu puxar o gatilho.
A dinâmica entre os irmãos foi um dos pontos mais comoventes do episódio, aliás, estou muito satisfeita com todos os plots da família Walker, que deixou o estado de negação em grande estilo. O discurso de Kieren afirmando que ao contrário de alguns dos sofredores do SFP, ele não acredita que está tudo bem só porque não conseguia se controlar. Num momento comovente, Jem assumiu se sentir covarde por não ter matado o irmão naquele momento. Como não amar quando Kieren agradece a ela por não matá-lo e garante que ele está feliz por estar de volta? Tive medo de como terminaria a conversa com os pais de Lisa.
Enquanto a maioria se abre para a realidade, a família Lancaster prefere alimentar falsas esperanças. Fiquei surpreendida quando eles não demonstraram surpresa com a confissão de que Kieren matou e comeu literalmente parte da garota. No final das contas, nem sabemos se são falsas esperanças, afinal de contas, o corpo da garota nunca foi achado. Mesmo não tendo tido coragem de matar o irmão, Jem deixaria que ele comesse inteiramente os restos de Lisa? Duncan e Patty mantém toda a esperança com base no que já viram em filmes de zumbis, o que me leva a crer que trata-se de mais metáfora da série, sobre acreditar no que queremos ou, de certa forma, precisamos.
O episódio ainda fez questão de trabalhar com intensidade o estado emocional dos pais de Kieren. Foi lindo ver a declaração da mãe, tanto no grupo da Shirlei quanto na caverna. Como pais podem esconder uma história de amor tão linda dos seus filhos? Mas nada é por acaso e não tenho dúvidas de que aquele era o melhor momento pra mãe do Kieren conversar com o filho sobre o assunto. E o pai, que parecia tão apático e fugindo da realidade, se tornou um herói, digno dos melhores pais dos mundos das séries. Bons pais sempre perdoam os filhos e aplicam castigos merecidos, não se pode ser tão compreensivo todo o tempo. Não consigo nem imaginar o que um pai que encontra o filho com pulsos cortados deve sentir, mas foi muito lindo ver a família Walker reunida e Kieren com uma segunda chance.
A negação também acabou na residência dos Macy’s, só que infelizmente com rumos completamente diferentes da família Walker, já que tolerância não era algo presente no coração de Bill. Quando a conversa sobre matar Kieren começou, eu imaginei um cenário em que Rick teria que escolher entre a vida do pai ou do Kieren. In The Flesh foi além do lugar-comum e, embora em certo momento os rumos do roteiro se tornassem previsíveis novamente. Quando Rick se olhou no espelho, estava claro que ele ia remover a maquiagem.
Quando Rick se mostra para o pai como é, só havia duas possibilidades: aceitação ou morte. Tive calafrios no momento em que Bill diz a Rick que percebeu que algo estava errado e queria ajudar. Apesar dele abraçar o filho chorando e dizer que tudo ia ficar bem, não consegui ver tolerância nos olhos de Bill, estava praticamente enxergando ele puxar a faca e matar o filho na sala de casa. E como muito não é mostrado na série, a dor ficou na cena do Kieren encontrando Rick morto na porta da sua casa. A despedida dos dois foi muito linda e sutil, apenas com palavras ditas no ouvido.
Quem mais teve medo do Kieren com aquela faca na mão? Eu vislumbrei um embate mortal entre os dois. E o enfoque foi melhor que o esperando, com um diálogo triste e sofrido, terminando com a coitada da Janet chorando desesperada ao descobrir que o marido matou seu filho. Depois de repetir as palavras do vigário, Bill acaba percebendo a barbaridade que cometeu e sai desnorteado de casa. O vizinho de Kieren parecia apenas vagar sem rumo depois que perdeu a esposa na premiere, até que o roteiro de In The Flesh mostrou mais uma vez que não deixa nada ao acaso: Ken dá um tiro certeiro e mata Bill. Ainda devastada com a morte do filho, Janet se ajoelha ao lado do corpo do marido e pede ajuda. Quem iria socorrê-los?
Estou brava por terem me feito amar tanto a Amy pra depois conceder nem cinco minutos em tela pra personagem. O que levou a garota a dormir justo com Philip, o pau-mandado mais preconceituoso e medroso da cidade? Isso não era o mais importante e sim o embate entre os dois, disputando quem deveria ter mais vergonha do relacionamento. Tive muita raiva da forma como a garota feliz foi tratada pelo Gary. Meu coração partiu quando Amy entrou naquele trem. Entendo que ninguém quer ficar onde não lhe tratam bem, mas porque deixar o vilarejo justo agora que ela encontrou um amigo em Kieren? Tenho muito medo do dono daquele website.
No episódio passado o Dean foi mordido por um zumbi não tratado e, embora tenha sido falado que a síndrome não passa através de contato, Gary disse não querer arriscar e prendeu o homem em quarenta. Claro que a gente que o motivo da prisão foi pura dor-de-cotovelo. Dean sentiu na própria pele o desprezo dos moradores da cidade e como era ser tratado como um monstro – mesmo não se sentindo um. O discurso do vigário me deixou muito intrigada. Seriam apenas delírios ou uma nova ascensão estaria por vir? Pra encerrar a temporada de forma ainda mais marcante, acompanhamos o enterro dos Macy’s.
Não há o que reclamar quanto ao roteiro apresentado. A história entre Kieren e Rick é tratada com uma delicadeza marcante, a loucura e a cegueira de Bill são descritas com verossimilhança do nosso cotidiano, momentos emocionantes são produzidos sem forçar, como a covardia de Rick, o egoísmo do suicídio de Kieren, a fraqueza de Steve, a revolta de Jem, etc. Cheia de emoção, ainda me resta um gostinho amargo deixado pelas perguntas não respondidas (como por exemplo o que pretende o louco do website).
Não há nenhuma confirmação oficial, mas em um entrevista em vídeo, o criador da série, Dominic Mitchell, deu a entender que In The Flesh seria renovada para uma segunda temporada, oportunidade em que muitas das questões remanescentes poderão ser respondidas. Todos na torcida?
