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Antes de mais nada, um feliz ano novo para você. Que 2018 tenha um roteiro muito…

Mad Men 4×13 – Tomorrowland (Finale)

Por: em 22 de outubro de 2010

Mad Men 4×13 – Tomorrowland (Finale)

Por: em

Mad Men Don Pete Cooper

What about Tomorrowland?
I don’t want to ride an elephant, I want to fly a jet!

Todo mundo quer, Bobby. O elefante é grande, devagar, desconfortável. Ninguém vai preferir subir nas costas do animal quando se tem um jato do lado, com toda sua promessa de adrenalina, empolgação, aventura. O problema é que todas essas vantagens do jato ocultam o fato de que talvez ele seja rápido demais. O elefante pode não ser o jeito mais agradável de se percorrer um caminho, mas ele te dá a possibilidade de aproveitar e assimilar tudo o que tá acontecendo ao seu redor. É mais difícil, mas vale a pena a longo prazo. Só que quem tá disposto a esperar?

Não o Don. Ele preferiu deixar a calma e a segurança de lado e partir pro arriscado. Afinal, o que ele tem a perder agora? A quarta temporada de Mad Men, mais do que nenhuma outra, mostrou o personagem se perdendo e tentando se encontrar, e quando o relacionamento com a Faye parecia demonstrar a personalidade de Don — a verdadeira personalidade de Don — quase que plenamente definida, a gente recebe uma pancada de frente. Não tá nada definido na personalidade de Don, porque nunca tá nada definido na personalidade de nenhum de nós. O pedido de casamento súbito foi o jato que Don escolheu, e ironicamente, foi anticlimático pra caramba — a surpresa, em vez de empolgante, foi estranha. Não porque a história não funciona pra série, mas exatamente porque ela DE FATO funciona. Eu tava tão ligado nos problemas que a saída da Lucky Strike ocasionou na agência, que esqueci completamente que por trás dessa dor de cabeça existem inúmeras pessoas reais e imprevisíveis. Do dia pra noite, tudo pode virar de cabeça pra baixo.

E é engraçado como algo que a própria Faye diz no começo do episódio faz com que o casamento de Don e Megan soe tão normal na sua bizarrice. “Maybe that sick feeling might go away if you take your head out of the sand about the past. It’s not that simple — and you don’t have to do it alone — but if you resolve some of that, you might be more comfortable with everything, and then you’re struck trying to be a person like the rest of us.” A partir do momento em que Don se sente confortável com quem ele realmente é — e isso se mostra perfeitamente quando ele conta pros filhos quem é o Dick escrito na parede da casa da Anna —, ele se sente livre pra viver a sua vida do jeito que quiser, sem medo das escolhas que tomar. Isso é perigoso (como qualquer jato) porque desconsidera uma cacetada de coisas que ficam pra trás sem que ele nem perceba. Como o sofrimento da Faye. Boa parte do episódio mostra Don e Megan vivendo num conto de fadas, mas o choque de realidade quando eles voltam pra Nova York chega com tudo. É triste demais a dor do telefonema quando Don tem que contar a verdade.

Mas o legal de Mad Men é que em momento algum a decisão de Don é julgada. A série só nos dá os elementos pra nós mesmos tomarmos a decisão de concordarmos ou não com a escolha dele. Por mais que o final do episódio tenha mostrado alguns momentos considerando o lado negativo do casamento, todas as cenas na Califórnia funcionam MUITO a favor do casal. Eles são perfeitos lá. Não só pela paixão que explode nos olhos de cada um dos personagens, mas até no jeito como Megan se entrega ao cuidar das crianças. Quando Bobby e Sally começam a brigar e derramam o milkshake, a primeira reação de Don foi se preparar pra dar um esporro fenomenal nos dois, mas Megan cuida de tudo com tanta tranquilidade. É impossível não se encantar e abrir um sorriso no rosto. A Califórnia de Mad Men sempre é colorida e cheia de vida, mas dessa vez ela realmente expressava uma felicidade fora do comum. Parecia um sonho.

Mad Men Don Pete Cooper

E a intenção era essa mesmo. No corte seco entre as cenas da Megan contando a novidade pra mãe e o Don de volta ao escritório olhando pela janela (momento muito legal de se comparar com o cartaz promocional da quarta temporada), existe um abismo gigantesco que causa um baque enorme quando se passa de um lado pro outro. A grande surpresa é que o ‘sonho’ também era realidade. Usando uma comparação besta, é quase como se eu sonhasse que ganhei na loteria, e quando acordasse, lembrasse que eu realmente ganhei. O baque faz efeito, mas aos poucos, porque enquanto no sonho tudo é perfeito, na realidade existem milhões de fatores que impedem essa perfeição toda. Eu posso até ganhar na loteria, mas ainda vou ter que lidar com burocracias, hipocrisias, e todas as dores de cabeça que uma bolada milionária pode trazer. O Don pode até ter ganhando a mão de Megan, mas ainda vai ter que lidar com todo o burburinho, fofocas, preconceitos que sempre vão cercar o casal.

Se eu tivesse um problema com o episódio seria a falta de coesão entre essa história de Don e as tramas do escritório. Enquanto a do protagonista olha sempre pro futuro, na agência eles ainda tem que cuidar de todos os escombros deixados no presente. Mas correndo o risco de soar puxa-saco pra caramba: até isso funciona bem, porque é exatamente esse contraste que externa toda a estranheza de ver Don e Megan se casando. É o que possibilita a reação de Peggy ao saber do assunto ser tão divertida de se assistir. É o que monta a minha cena preferida de toda a finale.

A conversa de Peggy e Joan mostrou uma sinceridade e uma cumplicidade muito forte entre as duas, mas não é nem apenas isso que me deixou com um sorriso de orelha a orelha ao assistir a cena. Era também a forma como pela primeira vez no episódio alguém dava voz à maluquice de tudo aquilo. Tomorrowland é uma novela, mas é uma novela que considera todos os detalhes de todos os episódios anteriores e mostra todas as interpretações possíveis pro que tá acontecendo. E dentro do contexto da série, todos os lados fazem sentido. Certeza absoluta que tem gente que concorda com a escolha de Don — e que não tão errados por isso —, mas dá pra dizer o mesmo sobre tudo o que Peggy e Joan discutem. O meu lado: pegar um pouco de ambos. Peggy tá certa demais ao se revoltar pelo escritório inteiro comemorar mais o casamento do que a assinatura do primeiro novo contrato pra SCDP desde o ‘incidente’. Joan provavelmente tá certa demais ao acreditar que Megan vai deixar de ser secretária e conseguir um cargo melhor por causa do marido. E Don tá certo demais ao encarar o peso de suas escolhas de frente e não ligar pra todo o julgamento que vem junto do casamento.

O que eu acho interessante é o fato da Joan falar com tanto desdém do clichê vivido por Don, mas ao mesmo tempo se encaixar dentro de outro clichê que ela mesma reconhecia há alguns episódios. A grávida com o marido na guerra. Achando que o filho é dele. Alguns de vocês foram bem mais espertos do que eu ao desvendar o falso aborto já em Hands and Knees (e em entrevista ao Sepinwall, Matthew Weiner falou que a intenção dele não era deixar ambíguo — o que me fez sentir ainda mais burro), mas apesar de eu ainda ter minhas dúvidas sobre o porquê de Joan mentir pro Roger, a história é um dos melhores cliffhangers deixados pro ano que vem. Por muito tempo eu tive a convicção de que Greg no Vietnã era sinônimo de Greg morto, mas é bem mais legal a série não escapar pelo caminho fácil e trabalhar com uma trama que provavelmente vai explorar muito do potencial de Christina Hendricks.

Mad Men Don Pete Cooper

E enfim, chegamos em Betty Draper. A personagem ficou BEM apagada durante boa parte da temporada, mas acompanhar a sua história agora nos últimos dois episódios foi uma maneira eficiente de evidenciar o maior contraste possível entre as vidas de Betty e Don depois do divórcio. Ele tá livre. Ela tá decepcionada. “I don’t know why I’m surprised”, diz Betty quando descobre sobre o noivado do ex-marido. É claro que você sabe, Betty. Mas como tudo que acontece na vida dela, existe um medo enorme de se expor, de agir verdadeiramente de acordo com suas vontades. Ela monta um espetáculo como se nada fosse culpa dela. Foi assim que ela conseguiu aumentar o número de sessões com a Dra. Edna. Foi assim que ela planejou a ‘surpresa’ de esbarrar com Don na casa prestes a ser posta em venda.

A cena em si foi fantástica em toda a sua composição — de maneiras bem distintas, uma casa vazia é o retrato ideal pra representar tanto o que Don passou, quanto o que Betty passou pra chegarem até aquele momento. Só que ao mesmo tempo em que é tão empolgante assistir a algo tão bem feito e tão bem cuidado, é extremamente doloroso acompanhar a história que se passa ali dentro. Aquilo que Betty tá passando. Entre viver as mesmas tristezas com Henry e com Don, ela prefere aquele tempo em que não precisava encarar tão de frente suas próprias dificuldades. Com o ex-marido, ambos viviam debaixo de uma máscara que nem ela e nem ele queriam tirar. Mas agora que Don se desprendeu dessa barreira e conseguiu se encontrar, é claro que ele não vai querer voltar pro que era antes. Ele tá olhando pro amanhã, e a velocidade de seu jato o impossibilita de olhar pra trás. A Betty também olha pro futuro, mas ela não tá em um jato — nem em um elefante. Ela tá sozinha. E odeia o que vê em sua frente. Também não adianta tentar olhar pro passado, porque o antigo Don não tá mais lá. O jeito é olhar pro presente, tentar finalmente encarar tudo o que ela tá vivendo e buscar ser uma pessoa melhor. Vai ser muito difícil. Mesmo. Mas é a sua unica opção.

Afinal, por mais que a gente contemple o futuro, não adianta ficar só olhando pra ele. Mais cedo ou mais tarde, ele se tornará o agora. É preciso caminhar em frente pra que exista fluidez, porque se a gente fica parado, o impacto nos derruba e tudo o que já não funcionava só vai se acumulando, e se acumulando, e se acumulando. A quarta temporada mostrou Peggy dando vários desses passos adiante. Pete dando vários desses passos adiante. Joan dando alguns. Roger dando outros… pra trás. Pryce tentando dar alguns, mas sendo impedido. Betty, nenhum. E o principal foi exatamente esse que Tomorrowland nos mostrou. Don e o seu primeiro passo.

Mas a direção dele a gente só descobre na próxima temporada.

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P.S.: A cena do Don pulando na piscina talvez seja a mais feliz de toda a série. Jon Hamm se esqueceu que tava em Mad Men e pensou que fosse um episódio de 30 Rock. (HÁ!)

P.S. 2: Carla ficou ausente a temporada inteira, mas agora que ela apareceu, recebeu uma cena espetacular com a Betty. Além do mais, foi exatamente essa cena que alavancou o maior desenvolvimento do episódio. Foi com a demissão de Carla que Don teve que chamar Megan pra Califórnia.

P.S. 3: Estranho demais darem um certo destaque pro Harry logo na season finale. De longe, foi o que eu menos gostei no episódio.

P.S. 4: Diferente do destaque dado ao Ken, que apesar de eu nunca ter ido muito com a cara, me surpreendeu. O jeito como ele valorizou a relação com o sogro (Ray Wise de fato vai ter importância na série) e comparou seu casamento com o de Pete foi excelente.

P.S. 5: Roger voltando a ser o alívio cômico da série. “So did you get Cancer?”; “Miss Calvet and I are getting married” “Who the hell is that?”; “Megan, could you get us some ice?”.

P.S. 6: “So you’re not gonna put an ad in The New York Times saying that you never liked me?” Ouch.

P.S. 7: Breaking Bad vai estrear sua quarta temporada só em julho do ano que vem, e independente da renovação ou não de Rubicon, temos um dilema aí. É MUITO difícil que a AMC programe seus dois maiores sucessos pra serem exibidos na mesma época, então é capaz que a quinta temporada de Mad Men só comece no final do ano que vem, ou até mesmo no início de 2012.

P.S. 8: Sonny & Cher = Jane & Herondy americano. Mas “I Got You Babe” é mó musicão.

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Foi muito, muito, muito recompensador acompanhar toda essa quarta temporada e escrever todas essas 13 reviews semana atrás de semana. O motivo: vocês que tão lendo. E principalmente, vocês que comentam. Todos os textos tiveram pelo menos um comentariozinho, e vocês sempre foram legais pra caramba, não só por serem muito gente boa, mas também por sempre acrescentarem muita coisa interessante na conversa. (Como foi o lance da gravidez da Joan.) Esse é o intuito de escrever essas reviews: gerar discussão, e por mais que Mad Men tenha um público bem reduzido aqui no Brasil, eu fiquei feliz demais de ver que toda semana tinham pessoas dispostas a falar sobre a série. E agora que a gente tem uma personagem fixa que fala francês, acho que nem vou precisar me desculpar pelo meu: Vocês são do caralho! 🙂


Guilherme Peres

Designer

Rio de Janeiro - RJ

Série Favorita:

Não assiste de jeito nenhum:

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