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The Crown – 1×09 Assassins

Por: em 7 de novembro de 2016

The Crown – 1×09 Assassins

Por: em

Estamos na reta final de The Crown e a série vem aliando muito bem os marcos históricos com a construção do seu drama. Assassins em particular tratou parelalamente dos últimos momentos do emblemático Winston Churchill como Primeiro Ministro, bem como ressaltou o quão distante e difícil tem sido o relacionamento de Elizabeth e Phillip – evidenciando a complexidade de aliar a vida de marido e mulher aos papeis de rainha e consorte.

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Se a série tivesse sido produzida por qualquer canal de TV aberta, certamente poderíamos esperar uma construção de conto de fadas da história do casal que começou a se corresponder quando a futura regente da Inglaterra tinha apenas  13 anos – e ainda sendo  Isabel, a princesa herdeira do trono – se encantou com o jovem oficial da marinha, então com 18 anos. Podemos estranhar a diferença de idade, mas é certo que eles nunca se relacionaram fisicamente nesta época – apenas começaram a cultivar um sentimento que se desdobraria em diversos contratempos na vida dos dois.

Mas é a Netflix e se uma coisa que ela sabe fazer em suas produções é transcender a realidade. Se The Crown começou colorida, ela se encaminha para uma conclusão em preto e branco – vemos que Philip não consegue se recompor do desgosto de sentir-se emasculado por não ser um marido e chefe de família como mandava o manual dos anos 50. Ele perdeu o nome e trabalho – tudo que antes o definia – e ainda não foi capaz de se reencontrar, de se reconstruir como consorte. A reação dele à todo esse cenário dificulta ainda mais a harmonia do seu casamento, já que o consorte claramente é beligerante e escolhe não vestir uma mascara de complacência ao seu dissabor.

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E, obviamente, a rainha sofre. Sofre por não poder – em decorrência dos seus compromissos –nem ter um momento de privacidade com seu marido, onde talvez eles pudessem sentar e conversas sobre o que se passa em suas cabeças e tentar pensar em uma maneira em que ambos possam tentar ser felizes dentro daquela união. O problema é que não há como mudar a sua condição. Ela tem a sua grande história de amor, mas onde a princesa se casa com o grande amor da sua vida, mas infelizmente ela não é da realeza da Disney – mas sim do mundo real.  Ao mesmo tempo que os dois se amam, eles se odeiam – tudo isso sendo inconveniente desenhado pela posição que ambos ocupam.

O casamento de The Crown é um casamento real – real sendo uma adjetivo depreendido de realidade.E, no momento em que a estranheza entre os dois chega à um nível gritante, a amizade de longa data com Porchey ganha mais terreno e contribui ainda mais para essa desagradável crise. Pelo visto não é segredo para ninguém que Henry sempre foi apaixonado por Elizabeth – que dividia do instenso intusiasmo pelos cavalos, mas nunca se iludiu, acomodando-se como um dos melhores amigos da rainha.

Elizabeth vê em seu amor pelos cavalos um refúgio para a crise em seu casamento. Nos estábulos, analisando as suas amadas e rentáveis criaturas, aparentemente ela esquece dos problemas, tanto reais quanto conjugais. Isso dá espaço para que a distância com Porchey se estreite, sendo exemplificada pela quase exclusiva linha direta com a Rainha que lhe foi concedida. Isso se dá quando o mesmo tinha conseguido dar o primeiro passo para o desapego à pedir a mão da namorada americana em casamento e prometer que ela seria a única mulher, sem ser hipócrita neste compromisso ao assumir que nunca foi lhe dada a opção, já que para ela sempre foi e sempre será Philip o home  da sua vida. À ele cabia a posição de amigo e administrador dos seus cavalos.

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Era óbvio que isso azedaria ainda mais a relação de Elizabeth com o marido – e Matt Smith vem fazendo um formidável trabalho, já que seu personagem não poderia transparecer seu descontentamento com a vida de maneira mais clara e afrontosa, fazendo com que a rainha – que sempre se atém ao esforço de permanecer plácida – explodisse em uma briga para a qual não nos é dada a chance de ouvir, apenas observar que ela não é de ferro. Bem como há a coragem e segurança dela em afirmar,  encarando seu cônjuge de cabeça erguida que (in)felizmente foi com ele que ela escolheu casar e é somente ele que ela amará. O problema é que Philip precisa se reencontrar como homem antes de conseguir novamente ser feliz e estar aberto para este relacionamento.

Outro importante homem na vida da rainha também foi o foco de Assassins. Churchill além da relevância histórica por seu papel como chefe de governo britânico, também foi uma das pessoas que moldaram Elizabeth como rainha. Ele foi o seu primeiro Primeiro Ministro (de doze), tendo o relacionamento dele com a rainha se transformado ao longo do tempo. Se à princípio ele a considerava imatura, logo ele foi cativado pela jovialidade e autoridade precoce da monarca. Para ela, ele foi um herói britânico, essencial para a transição da Inglaterra como país vitorioso no final da 2ª Guerra.

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Apesar de toda sua biografia, a idade também chegou para um homem que atualmente é um ícone da história. O tempo e a vida começaram a cobrar a conta, e para a pessoa de personalidade forte – que  enfrentou Hitler e o Nazismo – aceitar a fraqueza acaba tornando-se algo quase impossível. E, em 1954, quando este completou 80 anos, foi quando a realidade desabou sobre ele e The Crown fez um trabalho sublime em retratar ao colocar o líder conservador diante de Graham Sutherland, pintor modernista contratado pelo Parlamento para eternizar a imagem do seu lider.

Churchil era apaixonado pela pintura, entusiasta e se deparar com um profissional de uma escola contemporânea – que desejava em sua arte captar muito mais do que a ficção que envolvia o nome de Churchill, mas sim a alma que estava castigada depois de 80 anos, dos quais – como muito bem ele diz em seu discurso – 54 foram dedicados ao seu país. Durante sessões, que muito provavelmente se estenderam por meses, os dois tiveram encontros esporádicos que, em algum momento, fizeram com que o Primeiro Ministro conseguisse de despir da sua mascara, deixando transparecer o homem dentro dele. A série tentou demonstrar tal desconstrução traduzida em uma conversa em que Sutherland e Churchill encontraram como ponto em comum a dor de perder um filho. Todos os louros para o veterano John Lithgow, que conseguiu manifestar uma contida emoção diante de toda dureza que seu personagem se esforçou para sustentar.

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E tudo parecia ter corrido bem até ao momento em que a pintura foi concluída e Churchill a viu – e The Crown fez desse primeiro contato um espetáculo, onde diante de todos, o Primeiro Ministro escondeu o seu descontentamento com o rosto que o encarava na tela com sua ácida liturgia. O confronto estre o pintor e o seu retratado foi para mim o melhor momento do episódio, pois naquele momento houve a realização de que ele finalmente não tinha mais condições para prosseguir se escorando na imagem do líder que ele tinha sido um dia. Ele estava idoso e cansado, e diante disso, pela primeira vez na vida, ele iria se resignar.

A conversa dele com a Rainha, bem como o discurso dela feito em sua homenagem, deixaram cristalinos que a Inglaterra nunca mais encontraria um líder tão importante como ele – tanto pelo homem que ele foi, como pelo contexto histórico em que ele viveu. Em Assassins são colocados em pauta 3 homens que ajudaram a moldar o reinado de Elizabeth, cada qual com as suas particularidades, porém ocupando espaços talvez equivalentes na vida da rainha.

Estamos quase chegando no final da nossa maratona. Como está sendo para vocês? Comentem conosco!

Observações:

– Frank Dillane ficou bem diferente na série, demorei para reconhecê-lo em um contexto bem diferente do que Stannis tinha em Game of Thrones.

– A cena da esposa de Churchill queimando o quadro, apesar de não ter sido expresso na série, representou algo feito depois da morte do marido. Da pintura restaram apenas alguns dos esboços preparatórios que, atualmente, estão na posse do National Portrait Gallery, em Londres.

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– Churchill era realmente apaixonado pela pintura, tendo escrito um livro sobre o tema  e dito que quando morresse, chegado ao céu, iria definitivamente passar os primeiros cem anos da eternidade a pintando.

– Porchey foi o administrador dos cavalos da rainha por 32 anos, até a sua morte em 2001. Ela quebrou as regras ao comparecer ao seu funeral.


Lívia Zamith

Nascida em Recife, infância no interior de SP e criada no Rio. Vivo e respiro Séries, Filmes, Músicas, Livros... Meu gosto é eclético, indo do mais banal ao mais complexo, o que importa é ter conhecimento de causa.

Rio de Janeiro - RJ

Série Favorita: São muitas!

Não assiste de jeito nenhum: Friends (não gosto de sitcoms)

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