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The Fall é uma série misógina?

Por: em 14 de janeiro de 2017

The Fall é uma série misógina?

Por: em

Ano passado, chegou ao fim a série The Fall, que contava a história da investigação criminal liderada pela detetive superintendente Stella Gibson (Gillian Anderson) para capturar o serial killer Paul Spector (Jamie Dornan). Stella é uma investigadora experiente chamada pela polícia para resolver o assassinato de uma jovem na região de Belfast, mas ela acaba descobrindo uma ligação com casos anteriores. A série, tida por muitos como feminista, foi alvo de críticas. Alguns críticos defendem que em vez de ser uma série feminista, The Fall acabou se tornando uma série misógina. Entretanto, os argumentos que ancoram a tese parecem frágeis:

1 – Stella Gibson é objetificada

Dizem os críticos que ao ser apresentada como uma mulher muito atraente, que está sempre vestida em roupas decotadas, sensuais, a idéia de que ela é uma mulher poderosa e intimidadora, que gosta de sexo, acaba soando mais como um fetiche do que como uma representação feminista de uma mulher empoderada.

Na minha opinião, essa é uma visão distorcida da personagem. A sexualização desta personagem não é fetichizada, mas serve ao propósito de mostrar que mesmo uma mulher muito empoderada, que domina em um campo de atuação masculino, ainda será questionada, especialmente se esta mulher demonstrar um comportamento que não é socialmente incentivado para determinado gênero. Por várias vezes durante a série, o profissionalismo e as decisões de Stella foram questionados por causa do seu comportamento sexual. Diferentemente, por exemplo, de outras séries nas quais o sexo e a nudez feminina servem apenas ao propósito de chamar a atenção do público, em Stella o sexo ajuda a contar uma história mais profunda, a montar as camadas que formam esta personagem incrível.

2 – Humanização do assassino Paul Spector

Os críticos afirmam que os roteiristas fizeram um assassino misógino, mas ao mesmo tempo, fizeram com que o público gostasse dele, pois ele é um bom pai, gosta de crianças, trabalha ajudando uma mulher a se livrar do marido abusivo e, principalmente, o ator Jamie Dornan é muito bonito para o papel.

The Fall é uma série que confia na inteligência do público. Certamente, algumas pessoas poderão assistir à série e interpretar desta forma, mas a intenção dos roteirista é clara: Mostrar o público que o misógino pode se esconder atrás máscara mais bonita. A face da misoginia pode ser qualquer uma, inclusive a de um homem que ama a sua filha, que passa seus dias ajudando mulheres, não há uma receita de bolo para reconhecer um homem misógino, especialmente aqueles que escondem a sua misoginia para mostrá-la apenas quando é conveniente para ele. A dinâmica de Paul Spector e Stella Gibson funciona porque The Fall é uma obra inquietante que faz com que o público veja o assassino misógino através dos olhos de uma mulher feminista. Ela o vê pelo o que ele de fato é: um homem. Humanizar um misógino é necessário, porque afinal de contas, eles não são monstros, mas homens que estão por todos os lugares fazendo coisas triviais.

3 – Glamurização do Feminicídio

Este argumento afirma que as vítimas são mostradas nuas, em posições sensuais, revelando uma intenção misógina de glamurizar o feminicídio e objetificar as vítimas.

É verdade, as vítimas realmente sejam mostradas nuas e posições sensuais. Mas isso serve a um propósito específico: Mostrar o modus operandi de Spector e tentar fazer com que o público compreenda as intenções do personagem. Contudo, é bom esclarecer que apesar de ser uma série sobre um serial killer, The Fall praticamente não mostra os assassinatos em si, exceto por um deles, que saiu fora de controle. Neste único caso em que a série mostrou a cena do assassinato, não há nenhum glamour envolvido, nenhuma romantização, apenas uma violência brutal e chocante.

4 – Criado por um homem

Crítica: Dizem que um homem não poderia criar uma série verdadeiramente feminista.

É fato que mulheres estão mais aptas a falar sobre as questões que afligem e interessam às mulheres do que homens. Porém, é possível encontrar boas obras escritas por homens que acertam em criar personagens femininas verdadeiramente interessantes e cujos arcos narrativos que se ancoram em questões feministas. The Fall é um dos casos em que há uma preocupação em analisar a mulher em diferentes contextos, idades, profissões e personalidades e é muito bem sucedido nessa tarefa. Com certeza, eu gostaria de ver mais mulheres criando histórias sobre outras mulheres para a TV, diversidade nunca é demais. Contudo, The Fall não se enquadra no grupo de séries que representa mulheres de forma inverossímil ou degradante por causa do gênero do seu criador. É preciso lembrar também que há diversas correntes feministas e que não existe consenso para muitas questões. Por isso, talvez a representação de Stella não seja a melhor para determinados grupos feministas, enquanto para outros ela se tornou um ícone feminista.

The Fall não é uma série misógina, é apenas uma série que fala sobre misoginia e confia em seu público para entender a diferença entre uma coisa e a outra. É uma série que deixará saudades, Tanto pela excelente cinematografia, quanto por sua personagem principal. Stella Gibson sempre terá um espaço entre as personagens femininas mais intrigantes das séries de TV.


Gizelli Sousa

Arquiteta, feminista, prefere uma noite de maratona de séries do que sair para a balada.

Brasília/DF

Série Favorita: The Walking Dead

Não assiste de jeito nenhum: Gilmore Girls, The O.C., One Tree Hill, Girls, Love

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