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Primeiras Impressões: The Get Down

Por: em 12 de agosto de 2016

Primeiras Impressões: The Get Down

Por: em

De uns tempos pra cá, uma tradição muito forte – e antiga – do audiovisual hollywoodiano têm ganhado bastante espaço na grade da televisão americana: obras cujas tramas observam e investigam a indústria do entretenimento de um ponto de vista diferenciado. E nesse termo guarda-chuva que é “indústria do entretenimento”, a TV acumula alguns casos de sucessos que exploram esse universo em suas mais diferentes facetas: o mundo dos corais de Glee, a música country de Nashville, a Broadway de Smash e a música negra de Empire – e isso são só os exemplos mais marcantes e recentes. Provavelmente, o sucesso de séries com esse formato nos últimos tempos foi decisivo para que a Netflix abraçasse com bastante força a primeira investida de Baz Luhrmann na televisão: The Get Down. Se você não está familiar com o nome do diretor, é provável que esteja pelo menos com as obras. Moulin Rouge!: Um Amor em Vermelho e O Grande Gatsby? Imaginei. Então, sim, a pergunta mais natural agora seria: o que um artista conhecido por flertar com os grandes atos, com a extravaganza e com o burlesco, foi se enfiar na periferia de Nova York nos anos 70? Eu realmente não sei. Mas, olha, deu certo.

The Get Down é uma série que retrata o surgimento do hip-hop, no subúrbio novaiorquino no fim dos anos 70. Esse retrato é recortado pela figura do protagonista Ezekiel Figuero (Justice Smith), o Zeke, um garoto com uma família bastante turbulenta mas com um talento incrível com as palavras e as rimas. Zeke é apaixonado por Mylene (Herizen F. Guardiola), filha de um pastor extremamente conservador que sonha em ser uma cantora de sucesso. Ok, essa pequena sinopse pode dar a entender que a trama é bastante superficial. Mas confia em mim, não é.

The Get Down - 1x01

Zeke é acompanhado de 3 amigos: Dizzee (Jaden Smith), Ra-Ra (Skylan Brooks) e Boo-Boo (Tremaine Brown, Jr.). Os quatro funcionam como uma espécie de mini-gangue que elucida o aspecto “macro” do subúrbio nova-iorquino: as gangues de verdade. Os garotos vivem numa zona de guerra entre duas facções bastante violentas, uma liderada por traficantes negros, e outra por latinos. Nessa disputa, surgem as figuras de Cadillac (Yahya Abdul-Mateen II) – o principal nome da gangue negra –  e Shaolin (Shameik Moore) – uma lenda do grafite que espalha sua tinta pelo Bronx. As duas figuras são construídas pelo roteiro com uma aura de mitificação (Cadillac é o caminho de Mylene para o sucesso, Shaolin é o grande mito que faz os grafites perfeitos que Dizzee e os meninos tanto admiram), mas logo são submetidos a eventos que quebram essa aura e os põe no mesmo nível de vulnerabilidade que o resto dos personagens.

Aliás, Nova York funciona quase como uma personagem da trama, uma vez que tem papel fundamental no lado político da trama. As tensões da cidade, seja no que diz respeito às gangues, seja na reurbanização forçada do Bronx (e na óbvia relação entre as duas coisas) ocupam boa parte do tempo de tela desse primeiro episódio. Para ser honesto, se The Get Down tivesse que vender uma tese, seria a de que as dinâmicas da “urbanidade” nova-iorquina, em termos políticos, foram as responsáveis pelo surgimento do hip-hop.

Essa tese é óbvia, e poderia ser resolvida sem muito questionamento. Mas – e aí com certeza nos tivemos uma voz ativa do sr. Baz Luhrmann na criação -, as coisas são sempre questionadas e, por mais que esteja tudo mais ou menos mastigado, a trama tem um ritmo próprio que faz com que o enredo seja bastante engajante. As coisas não ficam óbvias ululantes na nossa cara, mesmo que a trama não seja exatamente muito elaborada. Além disso, as figuras  de Cadillac e Shaolin dão um fôlego diferente a essa dinâmica política-crime-música, e facilitam que nós nos convençamos de certas coisas que a um primeiro olhar pareceriam inverossímeis. 

Muito desse ritmo se deve principalmente aos números musicais e à relação deles com o resto da trama. Numa trama que pretende analisar o hip hop e seu universo, uma leitura de poema é quase um número musical. E esse tipo de “liberdade” poderia ser um fator para que os números fossem deslocados demais e sem justificativa narrativa (como uma parte considerável das performances da 2ª temporada de Empire), e, numa série que pretende ser realista, coisas assim não caberiam. Mas, com a direção musical de Nas (um rapper excepcional, se não conhece essa é uma ótima oportunidade), as faixas – que por si só já são excelentes – foram encaixadas na trama sem grandes percalços. E, numa série musical, isso já é metade do caminho.

The Get Down - Mylene

O fim do episódio é bastante significativo. Literalmente, todo o núcleo principal da série está sonhando com uma vida melhor. Existe algo mais musical que sonhar com uma vida melhor? Shaolin – agora desnudo de sua máscara de mito e tão sonhador quanto qualquer um -, os meninos, Mylene: tudo que querem é dar o próximo passo. Já vimos histórias assim na TV e no cinema (inclusive no cinema de Baz) aproximadamente um bilhão de vezes, mas a série reformula isso a sua própria maneira e é bem sucedida nessa empreitada.

Em resumo: assim como a festa que nomeia a série, The Get Down é uma colagem de obviedades e clichês (que estão virando a fórmula do Netflix com seu algoritmo) feita de uma maneira bastante agradável para quem resolve tomar parte. São muitos núcleos, muitas tramas, muitas coisas que a gente precisa acreditar. A série não é uma produção espetacular, mas tem aquele fator Netflix que faz a gente querer ver mais. Agora é esperar algumas horas e ver qual vai ser a reação do público, mas visto a estratégia de lançar a temporada em 2 partes (a próxima prevista para o ano que vem), o canal conta com que a série seja um sucesso. E não há grandes motivos para não ser.

Se ainda não deu uma chance, vale o clique. São 93 minutos que passam com gosto.

P.S.: As atuações em geral estão muito boas. Menção especial para a novata Herizen F. Guardiola, que interpreta Mylene. Um episódio e ela já me levou junto com ela pra dentro do drama. Só quero que ela (atriz e personagem) termine no topo das paradas. E que vozeirão!

P.S.2: Eu já falei, mas é bom repetir. Que. Trilha. Sonora. É. Essa!

P.S.3: A fotografia também não deixa a desejar, com uma dicotomia entre escalas de cinza de alto contraste e cores ridiculamente vibrantes. Bastante representativo da Nova York dos 70 (eu acho)

P.S.4: Um aspecto que não é tão impecável são os efeitos visuais. Mas nada pior do que as fantasias da ABC que tenha prejudicado a verossimilhança das cenas.

P.S.5: Colocar o protagonista 20 anos depois servindo de narrador também pode parecer uma saída fácil, mas funcionou e teve uma carga emocional bastante interessante.

P.S.6: Vontade de assistir o episódio de novo e fazer o Bingo Eu-Já-Vi-Isso-Em-Todo Mundo Odeia o Chris.


Gustavo Soares

Estudante de Cinema, fanboy de televisão, apaixonado por realities musicais, novelões cheios de diálogos e planos sequência. Filho ilegítimo da família Carter-Knowles

São Paulo - SP

Série Favorita: Glee

Não assiste de jeito nenhum: The Big Bang Theory

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