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American Crime Story – 1×10 The Veredict (Season Finale)

Por: em 7 de abril de 2016

American Crime Story – 1×10 The Veredict (Season Finale)

Por: em

Este post foi reformulado pela autora em 08/04/2016

Existem cenas que, por mais que você saiba como terminam, doem todas as vezes em que você assiste. Ver o Jack congelando, o John Coffey eletrocutado, o Thomas picado pelas abelhas, o Charlie trancado na Hydra… e o OJ sendo inocentado. Saber o que acontece não muda a revolta, a tristeza ou a impotência diante do que estamos vendo.

not guilty

Na primeira versão desta review, eu falei sobre o incômodo que tinha sentido com o final da temporada… não pelo veredito, que era algo que não poderia ser mudado, mas pela escolha narrativa de como encerrar o arco de OJ. Pois bem, dois dias depois, descobri através de um comentário deste post que o incômodo não teve nada a ver com os roteiristas, e sim com problemas técnicos, já que o episódio que eu assisti tinha quase meia hora a menos do que o que foi exibido.  Agora tudo faz mais sentido, por isso a minha opinião mudou sobre diversos pontos.

A direção acertou em cheio em retomar um recurso usado lá no início da série e juntar imagens reais com as da ficção. Ver o quanto aquele clima de final de copa do mundo tomou conta das ruas, dos programas de TV, dos escritórios e do país inteiro foi fundamental para que a gente percebesse o quanto estava em jogo naquele veredito. E também para mostrar que a estratégia de Cochran colou de verdade, já que o caso deixou de ser sobre Nicole para virar uma discussão racial. Mesmo isolados e privados de qualquer tipo de informação, o júri também foi contaminado por aquele discurso e se deixou levar pela emoção e pela história mais empolgante.

Falando em história mais empolgante, o ponto alto deste episódio foram as considerações finais de Marcia, Chris e Johnnie. Elas foram uma síntese do que esses personagens realizaram durante a temporada. Marcia com suas evidências técnicas, suas probabilidades, seus números tão irrefutáveis quanto desinteressantes. Com sua aparente confiança, mesmo percebendo que aquele era um jogo quase perdido. Marcia com sua racionalidade, que sempre acabou soando como frieza. Darden e sua sinceridade, sua sensatez, suas verdades, seus valores, sua sede por justiça que não encontrava pares nos olhos dos jurados. Darden com sua ponderação, que sempre acabou soando como traição à própria raça. E Cochran com seus jargões, seu discurso messiânico, inflamado, suas verdades tão absolutas quanto vazias. Cochran com seus bordões e teorias estapafúrdias, que sempre acabaram soando como heroísmo.

juri

O júri, exausto, estressado e claramente tendencioso, acabou aceitando a versão da defesa, mesmo que ela nem fosse de fato uma versão. O discurso de Marcia de que Mark era uma exceção na polícia de Los Angeles poderia convencer um júri formado por pessoas brancas, mas não aquelas pessoas. Eles certamente sabiam que o racismo de Fuhrman não estava só ali. Certamente já tinham passado pelas mãos de policiais igualmente racistas, assim como Johnnie no passado, ou conheciam alguém que o tinha feito… um vizinho, um filho, um pai ou um irmão. Apresentar Mark como exceção era uma mentira tão grande quanto a dele quando disse que nunca tinha ofendido um negro. Isso o júri sabia bem! Agora, DNA? Sobre isso ninguém conhecia nada em 1995.

Juice saiu da cadeia como um símbolo do movimento negro – do qual sempre quis manter a distância. Ninguém de fato acreditava na inocência dele (talvez o seu novo cachorro…), mas o importante era dar o recado: a polícia pode atacar, mas vai ter volta! Mas e Nicole? Nicole nunca teve justiça pela sua morte, foi soterrada por uma discussão que nada tinha a ver com o que de fato aconteceu. Negro ou não, OJ Simpson quase decapitou sua ex mulher porque nunca a enxergou como um ser humano, e sim como uma de suas posses. Ron, que tinha menos ainda a ver com a história, acabou injustiçado e esquecido. O sistema falhou em proteger Nicole todas as vezes que ela o denunciou, falhou porque não evitou a sua morte e falhou definitivamente quando deixou livre o homem que a destruiu. E da mesma forma que Mark não é uma exceção num contexto racial, OJ não é uma exceção no contexto de violência doméstica. Toda vez que uma mulher é agredida, mil vozes se levantam para culpa-la de alguma forma. Devia ter denunciado, devia ter se separado, devia ter adivinhado. Como se alguma coisa pudesse salvá-la…

Mas as coisas não terminaram tão bem quanto Juice esperava. Ele deixou a prisão, voltou para o seu bairro chique, para a sua mansão e para todas aquelas pessoas que sentem o cheiro do dinheiro e da fama e seguem o rastro, não importando para onde ele vá. Mas a ironia é: OJ se tornou de fato aquilo que ele alegou ser para ganhar o júri. Ele passou a ser visto pelos brancos do bairro como um intruso, um criminoso, alguém que não era bem vindo ali. Perdeu os amigos, o prestígio, os privilégios que o sucesso concedia e, apesar do veredito, foi visto como culpado de forma geral. Nada disso se compara ao que ele fez a Nicole e Ron. O futuro de OJ pode não ter se tornado um sonho, mas ele existiu e ainda era muito bom, comparado à realidade média das pessoas. Foi bom a série mostrar esse outro lado também.

OJ

The People VS OJ Simpson cresceu ao longo da temporada, tendo seu ápice entre o sexto e o nono episódio. Foi extremamente fiel em alguns momentos e soube ousar e preencher lacunas suficientes para transformar a obra em um entretenimento de qualidade, envolvente, cheio de nuances e que obriga quem assiste a pensar, repensar, questionar seus próprios valores e preconceitos e entender que a nossa tendência ao maniqueísmo não leva a nada de bom. Em tempos tão hostis e de verdades absolutas, esse tipo de reflexão é algo valiosíssimo.

Satisfeito com o final da temporada? Que momento foi mais marcante em American Crime Story para você? Quais foram as suas impressões depois de tudo que vimos? Obrigada por acompanhar as reviews, espero que tenha sido tão bacana para você quanto foi para mim. Deixe seu comentário e até a próxima!


Laís Rangel

Jornalistatriz, viajante, feminista e apaixonada por séries, pole dance e musicais.

Rio de Janeiro / RJ

Série Favorita: Homeland

Não assiste de jeito nenhum: Two and a Half Men

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