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Feud: Rivalidade entre mulheres

Por: em 29 de março de 2017

Feud: Rivalidade entre mulheres

Por: em

Spoiler Alert!

Este texto contém spoilers leves,

nada que estrague a série ou a sua experiência.

Ah, Ryan Murphy! O que seria de nós, apaixonados por séries, sem seus ousados trabalhos?

Para quem ainda não sabe, titia Ryan lançou no dia 7 sua mais nova série Feud: Bette and Joan, contando os bastidores do filme hollywoodiano What Ever Happened to Baby Jane?, traduzido como O Que Terá Acontecido com Baby Jane? e a história da famosa rixa entre as protagonistas do filme, Bette Davis e Joan Crawford. A trama parece ter sido feita apenas para que as atrizes Susan Sarandon e Jessica Lange fossem indicadas aos prêmios, no maior estilo Oscar Bait de séries, mas não é só isso que faz de Feud uma obra-prima.

De acordo com o dicionário informal, ódio é um sentimento de profunda antipatia, desgosto, aversão, raiva (…) contra uma pessoa ou algo, assim como o desejo de evitar, limitar ou destruir o seu objetivo. Essa declaração combina perfeitamente com o que Bette e Joan sentiam uma pela outra.

Se hoje em dia atrizes que já passaram dos 40 anos não conseguem papéis com tanta facilidade, imagine nos anos 1950/60, quando a todo instante jovens, com rosto, corpo e cabelo perfeitos, apareciam no meio cinematográfico e “roubavam” os lugares das mais velhas. Hollywood sempre incentivou as rivalidades entre profissionais; a mídia, os filmes e até a própria família das profissionais envolvidas lucravam com isso. É nesse cenário que essas duas mulheres se encontravam. Um cenário no qual o talento não era tão valorizado e sim, a beleza e o dinheiro.

Por que, então, Bette Davis e Joan Crawford são tão lembradas no cinema e televisão?

Ruth Elizabeth Davis, futuramente conhecida por Bette Davis, nasceu no dia 5 de abril de 1908, em Lowell, Massachusetts. Ruth tinha o sonho de tornar-se atriz, sendo influenciada por sua mãe que também desejava estar nos palcos. Começou sua carreira na Broadway e logo conseguiu assinar um contrato com a Universal e depois, Warner.

Na década de 1930, Davis era um sucesso. Conseguiu seu primeiro Oscar em 1935, por sua interpretação em Dangerous (Perigosa). O segundo veio em 1938, com Jezebel. Apesar do contrato com a Warner terminar em 1949, foi no ano seguinte que conseguiu o maior e mais famoso papel de sua carreira, como Margo Channing, em All About Eve (A Malvada).

Com a idade chegando e novas estrelas em ascensão, seu trabalho começou a entrar em declínio, sem papéis que a desafiassem e mostrassem seu talento. Certa vez, anunciou no jornal que precisava de emprego, escrevendo: “Mãe de três filhos, divorciada, norte-americana. 30 anos de experiência como atriz de cinema. Ainda em atividade e mais fácil de lidar do que os rumores dizem. Gostaria de um emprego em Hollywood (já trabalhou na Broadway)”.

Foi com O Que Terá Acontecido com Baby Jane? que ela voltou ao cinema e à televisão, e hoje é privilegiada com a segunda posição dentre as melhores atrizes de todos os tempos.

Lucille Le Seur nasceu no dia 23 de março de 1904, em San Antonio, no Texas. Seu grande sonho era ser dançarina e participou de várias peças da Broadway. Quando começou a trabalhar em Hollywood, em 1925, o presidente da MGM obrigou-a à trocar de nome, realizando uma votação para saber qual novo nome chamaria mais atenção. O escolhido foi Joan Crawford.

Durante sua carreira de sucesso, ganhou um Oscar em 1945, por Mildred Pierce (Almas em Suplício). Conhecida pela sua incrível e inconfundível beleza, colecionou inúmeros filmes ao seu currículo, entretanto, assim como sua rival, foi perdendo cada vez mais oportunidades, até que em 1962, conseguiu um papel em Baby Jane.

A rivalidade entre as duas é conhecida como a maior do ramo cinematográfico. Desde a juventude elas se odiavam, pois disputavam a maioria dos papéis principais, mesmo que fossem em filmes diferentes. Bette era da Warner e tinha uma extensa lista de interpretações marcantes e sérias. Suas personagens, geralmente, não eram nada boazinhas, o que combinava com sua personalidade ácida e língua afiada. Porém, era profundamente ignorada no quesito beleza. Na contramão, Joan era da MGM e a clássica estrela de cinema, com um rosto de dar inveja e palavras amorosas contrastando com uma tumultuada vida amorosa e forte insegurança.

Eu sou tão boa em interpretar malvadas porque eu realmente não sou uma… é por isso que a Srta. Crawford sempre interpreta as boazinhas.
Bette Davis

Como pode então, mulheres completamente diferentes, sem nada, tirando a atuação, em comum, se odiarem por tanto tempo? O fato de serem tão diferentes é o que impulsionou tal rixa. Cada uma olhava para a outra e enxergava o que faltava nelas mesmas. Uma, não era levada a sério no trabalho e a outra, não era considerada bonita o suficiente.

Um dos pilares da briga foi nada mais, nada menos do que um homem. Franchot Tone estava trabalhando junto com Davis, em Dangerous. A atriz se apaixonou perdidamente por ele e separou-se de um casamento já instável, com esperanças de que seu colega de elenco pudesse se apaixonar por ela. Só que um pequeno obstáculo com o sobrenome de Crawford, apareceu no meio para atrapalhar tudo. A sedutora e sex simbol da MGM também se interessou por Franchot e, segundo boatos, o convidou para um jantar em sua casa, recepcionando-o nua! O resultado de toda essa tramoia acabou no altar, com Bette morrendo de ciúmes e jurando que nunca iria perdoar a rival por tal ato. Parece até história de novela mexicana, não é?

Três anos depois, os dois se divorciaram e em 1943, Joan saiu da Metro-Goldwyn-Mayer e migrou para onde? Isso mesmo, para a Warner, onde disputou papéis com sua “amiguinha”.  O amor era tanto que ela mandava flores e mimos no camarim da Sra. Davis, que sempre rejeitava dizendo que tudo aquilo era assédio.

Na década de 1960, o brilhantismo das estrelas se apagou. Não conseguiam mais que seus filmes angariassem bilheteria, isso quando conseguiam papel em um. Os produtores não as contratavam mais. Alguma coisa precisava ser feita para voltarem ao estrelato.

Foi assim que Joan teve a brilhante ideia de mostrar o livro de Whatever Happened to Baby Jane?, do autor Henry Farrel, à Bette e perguntar se a mesma não gostaria de participar de um filme baseado no livro. Quem iria financiar uma película com duas atrizes na meia idade, sem sucesso, interpretando duas velhas rancorosas? Foi isso que Davis e toda Hollywood pensou, e eles tinham razão. Ninguém colocava fé nessa produção, a não ser Robert Aldrich, que não só produziu, como também dirigiu o longa.

O enredo era o seguinte: Jane Hudson, conhecida como Baby Jane, fez sucesso quando criança, mas perdeu o brilho conforme foi envelhecendo. Já sua irmã, Blanche, era uma superestrela que no ápice da fama sofreu um grave acidente deixando-a paraplégica. Juntas, as irmãs precisam conviver em meio à frustração e a vontade de Jane de voltar à fazer sucesso.

O filme, devo dizer, conquistou a crítica e o público, arrecadando uma incrível bilheteria. Todavia, não foi pela ótima história que ele ganhou tanto prestígio. Brigas, disputas, provocações e até um chute na cabeça, foram algumas das coisas que aconteceram nos bastidores e fizeram com que as pessoas ficassem tão interessadas. A mídia usou desse artifício como forma de divulgação e conseguiu ter êxito.

Em 1977, por conta de um ataque cardíaco, a lenda Joan Crawford morre. Se alguém ainda pensava que Bette iria ter arrependimento de alguma coisa que tenha feito, esse alguém quebrou a cara. A atriz declarou “não se deve falar mal de quem já se foi, só se deve falar coisas boas, como: ‘que bom, Joan Crawford morreu!”. Em 1989, era ela que falecia.

Essa treta de proporções bíblicas  não era do tipo “vou dar unfollow em você no Insta” ou “não quero ela por perto no Emmy”. Tudo foi muito profundo, muito sentido, era um ódio que não acabava mais e nada mudava aquilo. Na mídia (televisão, cinema ou música), é comum ver brigas entre famosos, seja pela repercussão que ela dá (alô alô Taylor Swift e Kim Kardashian!), seja por motivos pessoais. Isso gera dinheiro e fama para todos, afinal todo mundo se interessa por uma boa discussão, não é?

Enfim, Feud não é só mais uma série para ganhar prêmios. Durante seus episódios, ela vai mostrar que aquela inimizade existiu, mas que outro lado deve ganhar ainda mais atenção: a falta de oportunidades para as atrizes, consideradas velhas, e como a sociedade e a indústria aceitavam isso como algo certo.

Enquanto um lado for colocado contra o outro, os dois terão menos poder. Isso é histórico. De alguma forma, é disso que estamos falando, certo? De manter as mulheres sem poder.

Jessica Lange em entrevista para a Out Magazine


Karine Medeiros

Futura jornalista. Mora em uma cidade desconhecida. Apaixonada por séries. Cinéfila e bookaholic. Sonha em um dia morar em Nova Iorque. O que ama mais do que tudo isso? Comer e dormir.

Votorantim / SP

Série Favorita: Friends

Não assiste de jeito nenhum: The Big Bang Theory

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