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3% escancara hipercriticismo contra produções nacionais

Por: em 27 de dezembro de 2016

3% escancara hipercriticismo contra produções nacionais

Por: em

3% foto promocional do elenco jovem principal

Após um mês  da estreia de 3% e passada a euforia inicial do público e dos críticos, tive um tempo para maturar algumas opiniões pessoais sobre a primeira série brasileira Original Netflix e assim evitar escrever críticas (positivas ou negativas) no calor da emoção. Confesso que com a enxurrada de reviews, primeiras impressões, posts e comentários negativos sobre 3%, nem me interessei muito e só coloquei na minha lista para assistir depois (Aquela que tem uns 100 títulos e a gente nunca assiste). Mas depois rapidamente mudei de ideia e resolvi dar uma chance, mesmo contra toda a onda. Ainda bem! Foi uma grata surpresa, no fim das contas.

Não estou dizendo com isso que a série é a maior obra prima de todos os tempos ou sequer a melhor série da Netflix. Poderia ser melhor? Sim, claro. Tem seus defeitos? Também. O baixo orçamento de U$3Mi (confira abaixo um comparativo com outras séries do serviço de streaming), contribui para efeitos especiais mais pobres e poucas locações, além de um figurino e maquiagens questionáveis (Quem aí achou engraçada a graxa na cara da galera?).

budget

Poderiam ter amenizado esses problemas com uma temporada de menos capítulos, quem sabe? De qualquer forma, a série entrega um bom trabalho. Uma história interessante, com caras novas no elenco, diversidade de personagens, fuga do estereótipo do Vilão x Mocinho tão característico das produções nacionais e especialmente a ousadia de apostar em ficção científica quando até mesmo o público ainda valoriza mais comédias, filmes de policiais/bandidos, produções mais experimentais ou ainda está acostumado com as tradicionais novelas.

Falando nisso, conseguem se lembrar da última produção de ficção científica nacional que vocês assistiram ou que sequer ouviram falar? Pra mim foi “O Homem do Futuro” (2011) com o Wagner Moura, mas para ser sincera sequer me lembro de nenhum outro. Procurei e encontrei uma lista na Wikipedia e descobri que a quantidade de produções do gênero é ridiculamente pequena.

o-homem-do-futuro

Wagner Moura em O Homem do Futuro

Provavelmente os dois maiores pecados de 3% sejam o timing inadequado e ter sido feita no Brasil. O primeiro porque o esboço da série foi lançado em 2011 (ano do início das atividades da Netflix no Brasil) no Youtube, antes mesmo do lançamento de Jogos Vorazes (2012) na telona ou de qualquer outra franquia americana com temática distópica semelhante. Talvez se tivesse estreado nessa época, antes da hype, teria pelo menos uma relevância maior no quesito originalidade. O problema é que devido à resistência do público brasileiro em apreciar as produções nacionais, mesmo assim as pessoas provavelmente criariam outros motivos pra justificarem sua insatisfação de com pseudo argumentos.

Mas aí é interessante perceber que enquanto a crítica e público de fora tiveram uma avaliação majoritariamente positiva, aqui o que se vê na internet e na mídia tradicional é o completo oposto, com poucas exceções.

3

Rafael Lozano (Marco) no episódio Portão

Pra se ter noção, no IMDB, por exemplo, a avaliação da primeira temporada é de 7,6/10, com 8.7 de nota máxima no Capítulo 4: Portão. Comparando com as produções locais da Netflix isso não é ruim, visto que Marseille tem 6,9, Suburra tem 7,4 e Club de Cuervos é a melhor avaliada com 8,1. Pesquisando outras séries famosas na plataforma do IMDB, temos Luke Cage com 7,9 (que inclusive foi considerada uma das melhores estreias de 2016 aqui no APX), Supergirl (6,5), Legends of Tomorrow (7,1), New Girl (7,8), UnReal (7,9) e Empire (7,8).

Ainda mais interessante é perceber as reações opostas que sites, como o Motherboard, que tem versões em inglês e português brasileiro, possuem. A página brasileira destaca o inúmeros pontos negativos de 3% e a em inglês enaltece a série, chegando até a comparar a sensação de incômodo reflexivo que Black Mirror causa com a produção brasileira:

3%— como Black Mirror— impacta porque parece bizarro e distante, mas conforme o show se desenrola e revela seus mistérios, o público vai perceber que já fazemos parte do Processo” – MATTHEW GAULT (Motherboard)

black mirror

Será exagero comparar com Black Mirror?

Mas não para por aí: – o site Gizmodo também não poupou elogios ao mencionar a fuga dos padrões do estereótipo do “adolescente branco americano com problemas de autoridade” da produção de ficção científica hoje com histórias tão homogeneizadas. Destaca também que não é a melhor série da atualidade, mas que vale a pena conferir. E por incrível que pareça (!) deixa uma observação da importância de se apoiar os projetos de ficção científica fora dos EUA.

O Indiewire foi mais um dos que exaltou a série. O autor termina o texto, inclusive, falando que ficou surpreso e impressionado com a primeira temporada e chamou a série de convincente.

Em todos esses sites, é interessante perceber que a boa parte dos comentários dos elogiam a qualidade da série, criticam a dublagem em inglês e até enaltecem a atuação do elenco, que foi bastante questionada por aqui. Fato é que é muito mais fácil perceber uma excelente atuação na nossa língua nativa que em outro idioma, ainda mais quando a maioria de nós ainda lê legendas enquanto acompanha o desenrolar das histórias (ou vocês vão dizer que o Stephen Amell ou Ben Mckenzie são atores excelentes?). Então além da rejeição ao conteúdo nacional, ainda temos um olhar hipercrítico com relação a esse aspecto por motivos naturais: é mais difícil perceber uma atuação mais fraca em outra língua. Há também outro fator: estamos tão acostumados a ver conteúdos norte americanos – que o ritmo de fala, a musicalidade e a expressão corporal de produções de outros países se torna estranha, incomum e ou até mesmo “errada” e “malfeita”, quando na verdade são somente diferentes.

3

Vaneza Oliveira (Joana)

Uma frase de Nelson Rodrigues se encaixa muito bem nesse contexto de avalanche de críticas negativas de 3%:

O brasileiro é um narciso às avessas, que cospe na própria imagem. Eis a verdade: não encontramos pretextos pessoais ou históricos para a autoestima.

Não que com isso eu queira dizer que se deveria defender toda e qualquer produção só por ser brasileira. Longe disso! É só que, especialmente nesse caso, o alto peso dados aos pontos negativos foi tão visivelmente desproporcional que as pessoas de fora do Brasil tiveram uma experiência muito distinta dos brasileiros. É especialmente interessante perceber que o mesmo “fenômeno” se estende várias áreas: cinema, literatura, música… Nenhuma escapa.

Felizmente, no entanto, que a vida real ainda é mais que só de críticas negativas em fóruns e sites. A série já se encontra renovada para uma segunda temporada e também atenta para corrigir os erros desse ano de estreia.

 

 


Virgínia Martins

Formada em Engenharia Mecatrônica, brasiliense e completamente viciada em (quase) todo tipo de série.

Série Favorita:

Não assiste de jeito nenhum:

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