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A história das aberturas de série (e o novo botão da Netflix)

Por: em 24 de março de 2017

A história das aberturas de série (e o novo botão da Netflix)

Por: em

A Netflix lançou um botão que permite pular a abertura das séries e seguir diretamente para os episódios. A ferramenta ainda está em fase de teste e disponível somente para quem assiste pelo computador, mas já funciona em alguns títulos, como Mad Men. Ironicamente, a mesma Netflix é cúmplice da nova era de ouro das vinhetas de TV, que estavam em declínio nos últimos anos. Muitas séries do catálogo são introduzidas por belas obras-de-arte e merecem nossa audiência. Ignorá-las é uma opção… mas, se eu fosse você, não faria isso.

Em 1950, quando as séries chegaram à TV americana, as aberturas serviam para apresentar o elenco principal, expor uma breve sinopse do que estava por vir e fazer um product placement – termo usado pela publicidade para a inclusão de marcas em produções de entretenimento. Na primeira temporada de Papai Sabe Tudo, de 1954, há uma propaganda de cigarro e um narrador, ambos jamais imaginados hoje:

Rapidamente, a TV se tornou um item fundamental para as famílias, que passavam horas diante do aparelho. O número de programas aumentou e, claro, a competitividade também: as séries precisavam sair da zona de conforto para se destacar. A década de 1960 mudou a estética das vinhetas, como fica evidente na animação de Jeannie é um Gênio.

Depois da reviravolta em 1960, os anos de 1980 e 1990 foram marcantes para as vinhetas televisivas. A gente nem precisa ir muito longe para falar disso: a brasileira Castelo Rá-Tim-Bum tinha uma das aberturas mais chicletes da TV. Nos EUA, todo mundo tentava acompanhar o rap de Will Smith em The Fresh Prince of Bel-Air (Um Maluco no Pedaço), cuja letra narrava a história do próprio protagonista. A abertura de Full House (Três é Demais) também é inesquecível para quem se jogava no sofá para ver a série, que terminou em 1995. Vinte anos depois, a Netflix lançou o revival Fuller House e aproveitou a mesma canção para abrir os episódios, com uma nova mixagem. Como se não bastasse, ainda tem imagem da série original na montagem. Pura nostalgia (e prova de que boas aberturas valem a pena!). Gilmore Girls poderia ter feito copiado a ideia em seu retorno, porque sentimos falta da voz de Carole King.

Séries produzidas especialmente para esses portais de streaming, como Netflix e Hulu, têm mais flexibilidade de tempo. Não precisam limitar seus episódios ao padrāo da TV aberta – que geralmente disponibiliza 20 minutos para comédias e 40 para dramas, com acréscimo de intervalos comerciais. Antes de The Mindy Project ser transferida para a plataforma do Hulu, a série frequentemente reeditava sua abertura para caber na grade da FOX, nos dias em que o roteiro ultrapassava o tempo combinado. É uma alternativa compreensível para evitar cortar trechos da história – mesmo que a introdução de Mindy tenha somente 16 segundos. Online, dá para brincar com vinhetas extensas sem medo de ser feliz. House of Cards está aí como testemunha.

Ainda na Netflix, a vinheta de Stranger Things traz uma tipografia típica dos anos 1980, animada com uma dose de suspense, que revela imediatamente o tom da série. O sucesso foi tão grande, que existe um site para todo mundo escrever o que quiser com a mesma fonte. Bem legal, vai?

A vinheta pode entrar logo no início ou fazer uma ruptura, depois de um pequeno teaser em que vemos o que a trama do episódio nos reserva. De qualquer forma, é a marca registrada da série. Definiremos assim: a abertura das séries deixa o espectador no clima do que vai assistir. Vide o histórico de product placement em 1950, fica fácil entender por que, ainda hoje, essas aberturas geralmente são criadas por agências de publicidade. Estamos falando de um produto de marketing, que deve ser feito com excelência a fim de conquistar quem tem o controle remoto em mãos.

A longa introdução de Game of Thrones, por exemplo, foi dada à luz por 35 pessoas e levou três meses para ficar pronta. A apresentação do serial killer Dexter teve de ser reeditada algumas vezes até ficar nos trinques: o canal Showtime achou a versão original muito densa para ser exibida na TV, mas, depois de ajustes, não havia o que reclamar da versão final:

Sempre tem a exceção, e uma abertura pode ser sucateada pela necessidade de improvisação. O título animado de Lost é este exemplo. Veja o que aconteceu: o criador J.J. Abrams teve somente três meses para escrever, filmar e editar o piloto da série para a ABC – o mesmo tempo que GOT demorou somente para a vinheta. Então o próprio Abrams criou a abertura de Lost às pressas, no laptop, em pleno set de filmagem. Levando tudo isso em consideração, até que ela não é tão ruim, vai? Mentira – é, sim.

Enquanto The Simpsons investe pesado em animações inéditas para nos surpreender – que chamam de couch gag (ou “a piada do sofá”) -, outras séries optam por uma introdução propositalmente breve, devido a dois fatores principais: 1) redução de tempo na TV, permitindo que haja mais minutos para a trama em si; e 2) economia no orçamento, porque esses videoclipes caprichados custam caro. Às vezes, é tudo do que a série precisa – e nem dá para imaginar Riverdale ou How To Get Away With Murder com outras propostas. Girls conseguiu driblar essa obviedade do letreiro simples e, a cada semana, exibe uma nova combinação de cores diferente para abrir o episódio – similar ao conceito de The Simpsons, se me permitem a comparação.

Unbreakable Kimmy Schmidt tem uma das aberturas mais bem sucedidas e queridas pelo público. É um exemplo de videoclipe que capta perfeitamente o espírito irreverente da série, com todos os ingredientes para atrair nossa atenção: trilha original que fica na cabeça, cores vivas, foto de criança e imagens de acervo. Kimmy ganhou o pacote completo. Mas, como todo sucesso tem seu preço, espectadores atentos notaram o maior crossover que ninguém esperava:

A imagem da criança brincando com bambolê, que aparece tanto em Kimmy Schmidt quanto em The Americans, foi gravada originalmente em 1958 e está à venda no acervo da Getty Images para quem quiser comprar. Já é praticamente um item de colecionador, certo? E, por incrível que pareça, o universo comum de The Americans não pára por aí. Ainda na abertura, que dura meros 30 segundos, vemos fotos em tamanho 3×4 dos personagens da série, coladas por cima da imagem original. Pois um fã percebeu que essa mesma imagem foi usada em Parenthood para representar a família de Sarah Braverman. Que bruxaria é essa? Já podemos ver esse vídeo, produção?

Dividir a mesma imagem provavelmente é tudo que The Americans e Parenthood têm em comum. Ao som de Bob Dylan, a abertura de Parenthood traz outro ritmo para a TV, com conforto e harmonia. O videoclipe mostra várias cronologias da família Braverman, com fotos do elenco em diferentes idades – que se torna um jogo para nós, espectadores, identificarmos. Duvido que quem estiver acompanhando nossa maratona tenha pulado a introdução alguma vez. Por complicações de direitos autorais, a série também lançou uma adaptação da abertura para ser distribuída internacionalmente, com outra música.

Parenthood não foi a única a apostar em vozes famosas para abraçar o público: Dawson’s Creek também fez isso com a cantora Paula Cole e sua música I Don’t Want To Wait. E deu certo, né? A presença sonora é tão forte nas vinhetas, que muitas canções ficam marcadas como “daquela série”. Por exemplo: todo mundo sabe que California é a música de The O.C. – e tenha dó de quem disser que é da banda Phantom Planet. O elenco de Friends até participa do clipe oficial de I’ll Be There For You – quem é The Rembrandts mesmo?

Para ter certeza de que as aberturas são indispensáveis, sugiro um teste: busque uma série pela qual você já foi apaixonado, mas não assiste há muito tempo. Talvez alguma série mencionada no post se encaixe nessa descrição. Agora, veja a abertura. Tá sentindo isso? Esse friozinho na barriga? É a vinheta mexendo com você. Confesso que, entre tantas opções mais sofisticadas que eu poderia escolher, existe uma que nunca falha comigo:

A lista de séries e suas respectivas aberturas é imensa, então aproveitem o espaço dos comentários, abaixo, para citar todas que não entraram no post. Vinhetas são um misto de arte, publicidade e storytelling – não há nada igual. Por isso, também proponho um pacto a vocês, a fim de incentivar a produção de aberturas extraordinárias para as séries que ainda vão nascer. Repitam comigo: eu prometo não pular as aberturas de série. Vamos nos permitir esse um minuto, sem acelerar o tempo. Queremos mais. Muito mais.


Alice Reis

Jornalista que não bebe café, mas vai ao Central Perk com frequência. Gostaria de viver em todas as séries filmadas em Nova York.

Rio de Janeiro / RJ

Série Favorita: Friends

Não assiste de jeito nenhum: Game of Thrones

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